Como controlar a septoriose na produção de tomate industrial

A incidência da septoriose tem aumentado nos últimos anos em áreas de produção de tomate industrial. Sem cultivares com nível adequado de resistência, o controle químico tem sido a principal ferramenta

07.03.2016 | 20:59 (UTC -3)

A ocorrência da septoriose ou mancha-de-septória nos últimos anos tem aumentado em campos de produção de tomate para processamento industrial no Brasil. A doença é causada pelo fungo Septoria lycopersici Spegazzini e ocorre praticamente em todas as regiões produtoras de tomate do mundo, sendo mais comum em épocas quentes e chuvosas. É favorecida por prolongados períodos de alta umidade e temperaturas moderadas. No caso do cultivo rasteiro, voltado para o segmento de tomate para processamento industrial, torna-se ainda mais problemático devido ao adensamento das plantas e ao crescimento arbustivo, que propiciam a formação de um microclima favorável à doença.

O patógeno causa desfolha das plantas, reduzindo de forma significativa a produtividade e a qualidade dos frutos. Em algumas regiões ou épocas de cultivo as perdas provocadas pela doença podem chegar a 100% da produção, devido à morte das plantas (Pereira et al, Comunicado Técnico 96: CNPH, 2013).

A septoriose pode ocorrer em qualquer fase de desenvolvimento do tomateiro, mas os sintomas normalmente aparecem nas folhas baixeiras logo após o início da frutificação. Podem aparecer nos pecíolos, caule e flores da planta, raramente nos frutos. Inicialmente, surgem na face inferior das folhas na forma de pequenas manchas encharcadas de formato mais ou menos circular a elíptico, medindo de 2mm a 3mm de diâmetro. À medida que a doença se desenvolve, as lesões adquirem coloração marrom-acinzentada no centro, com bordas escurecidas e halo amarelado estreito ao redor, podendo atingir até 5mm de diâmetro. Em ataques severos as lesões coalescem, as folhas amarelecem, secam e caem. Lesões novas causadas por Septoria lycopersici podem ser confundidas por outras causadas pela pinta preta (Alternaria spp.), o que dificulta a identificação. A principal característica que auxilia na identificação do patógeno é o aparecimento de pequenos pontos negros no centro das lesões. Estes pontos são corpos de frutificação do fungo, denominados de picnídios, de onde são liberados os esporos do fungo. Os frutos produzidos em plantas severamente desfolhadas apresentam tamanho reduzido e queimadura em razão da exposição direta aos raios solares. Em tomate para processamento industrial, frutos com escaldadura acabam gerando uma polpa de pior qualidade, pela alteração na coloração.

Atualmente, não existem cultivares ou híbridos comerciais de tomate disponíveis comercialmente com níveis satisfatórios de resistência à septoriose. Fato atribuído à dificuldade de transferência dos fatores de resistência, geralmente quantitativos, de espécies selvagens para linhagens avançadas de tomate (Kurozawa & Pavan, Manual de Fitopatologia V. 2, 2005).

O controle da septoriose em tomateiros é realizado comumente com a aplicação foliar de fungicidas de contato e sistêmicos, muitas vezes já utilizada no controle da pinta preta (Alternaria sp.) e da requeima (Phytophthora infestans). Os fungicidas de contato podem apresentar menor eficiência que os sistêmicos por serem facilmente removidos pela água da chuva ou irrigações por aspersão. Atualmente, existem muitos fungicidas registrados junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para o controle da doença, como cúpricos, triazóis, isoftalonitrila, ditiocarbamatos e estrobilurinas. Entretanto, muitos dos ingredientes ativos não têm apresentado eficácia satisfatória quando as condições ambientais são muito favoráveis à ocorrência da doença.

Com o intuito de avaliar a eficiência destes produtos no manejo da doença, o Instituto Federal Goiano Campus Morrinhos, em parceria com a Embrapa Hortaliças, iniciou um estudo com o objetivo de testar os principais fungicidas registrados para esta doença no tomateiro em condições controladas de casa de vegetação e em campo, em cultivo rasteiro de tomate, simulando uma lavoura destinada ao processamento industrial. O primeiro experimento foi realizado em casa de vegetação situada na Embrapa Hortaliças (Brasília-DF), no período de fevereiro a março de 2013. Mudas (cultivar N901) com 25 dias de idade foram transplantadas para vasos de um litro contendo solo adubado e esterilizado. Dois dias após, foi realizada a primeira aplicação dos fungicidas, utilizando pulverizador manual, até o ponto de escorrimento. Uma segunda aplicação foi efetuada sete dias após. Foram avaliados uma testemunha somente inoculada com S. lycopersici e os seguintes princípios ativos: propinebe, metiram + piraclostrobin, azoxistrobina + difenoconazol e difenoconazol. As plantas foram inoculadas com pulverizador manual um dia após a segunda aplicação, utilizando suspensão de inóculo na concentração de 3×104 conídios/ml, e submetidas a uma câmara úmida por 18 horas. Foi utilizado delineamento de blocos casualizados, com quatro tratamentos, quatro repetições e parcelas compostas de quatro vasos com uma planta. A severidade da doença foi avaliada 12 dias após a inoculação, utilizando a escala adaptada de Mello et al (Fitopatologia Brasileira, 1997). Foram avaliadas as três primeiras folhas verdadeiras de cada planta.

O ensaio de campo foi conduzido na área experimental do Instituto Federal Goiano, Campus Morrinhos (17°49'28,85"S, 49°12'6,48"W e 892m de altitude), com plantio no dia 14 de maio de 2013. Para o transplante das mudas (cultivar N901, 25 dias) no campo, estas foram dispostas em fileiras simples, com espaçamento de 1,20m entre fileiras e 0,25m entre plantas. A irrigação foi realizada por aspersão via pivô central. O regime empregado foi semelhante ao utilizado em cultivos comerciais, aplicando-se lâminas de irrigação semanais de 20mm no primeiro mês de cultivo, e 30mm até aproximadamente 14 semanas de cultivo, quando a irrigação foi cortada para concentrar a maturação dos frutos. A parcela experimental consistiu de três linhas, cada uma com 24 plantas. As parcelas foram dispostas seguindo o delineamento experimental em blocos ao acaso, com quatro repetições para cada tratamento. Os tratamentos consistiram na aplicação dos mesmos produtos já descritos, com a mesma concentração, mas em volume de calda de 500L/ha. As aplicações dos produtos foram iniciadas dez dias após o transplante, sendo realizadas em intervalos de 14 dias, totalizando cinco aplicações. Para aplicação, utilizou-se pulverizador manual pressurizado com CO2, com pressão constante de 2bar. Para inoculação, folhas com sintomas de septoriose foram coletas de lavouras com epidemia da doença. Estas folhas foram levadas a laboratório para confirmação do agente etiológico. Confirmado tratar-se de S. lycopersici, as folhas foram mantidas em câmara úmida por 48 horas para incentivar a esporulação do patógeno. Em seguida, foram trituradas em liquidificador industrial, a parte sólida foi separada em peneiras e o líquido obtido diluído em água e pulverizado sobre as plantas 53 dias após o plantio. Para avaliação da severidade da doença, avaliou-se o percentual de área foliar lesionada, tomando-se por base a linha central de cada parcela. As avaliações foram realizadas aos 23 e 33 dias após a inoculação. Em função do adiantado estado de maturação dos frutos, muito provavelmente em função da intensa desfolha ocasionada pela doença, a colheita que estava prevista para 120 dias após o transplante foi adiantada para o dia 6 de agosto de 2013 (112 dias). Foram colhidas as linhas centrais de cada parcela, sendo pesado o total de frutos e os valores transformados para toneladas por hectare.

No ensaio em casa de vegetação, todos os produtos conseguiram reduzir a severidade da doença a níveis significativos em relação à testemunha não tratada. com percentual de controle superior a 85%. Entretanto, em condições de campo, a redução do controle da doença foi menos significativa, chegando a índices máximos de controle de 39% com o propinebe na primeira avaliação e de 32,25% com o difenoconazol. Com estes resultados, percebe-se que ainda há potencial para aumentar o nível de controle da septoriose em campo, investindo em estudos de tecnologia de aplicação que possibilitem níveis de controle próximos ao observado em casa de vegetação. O controle químico apresenta possibilidade de reduzir as perdas ocasionadas pela doença, resultando em incremento de produtividade e melhoria na qualidade da matéria-prima no segmento de tomate para processamento industrial.


Este artigo foi publicado na edição 88 da revista Cultivar Hortaliças e Frutas. Clique aqui para ler a edição.

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