IAC e unidades da APTA colaboram em pesquisa que comprova a sustentabilidade da cana-de-açúcar produzida no Brasil

19.10.2012 | 20:59 (UTC -3)
Fernanda Domiciano

Está comprovado, o etanol produzido da cana-de-açúcar é uma energia limpa. Pesquisa desenvolvida pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) em conjunto com o Instituto Agronômico (IAC), de Campinas, unidades da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA) e o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) revela que a quantidade de óxido nitroso (N2O), um dos gases responsáveis pelo efeito estufa, liberado na atmosfera durante o processo de produção da cana está abaixo do limite proposto internacionalmente.

De acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), em média, a liberação de óxido nitroso na atmosfera é de 1% do nitrogênio aplicado como fertilizante nas plantações. Parece pouco, mas o potencial de aquecimento global do N2O é cerca de 30 vezes maior do que o gás carbônico. Por meio dos estudos do IAC, APTA e UFSCar foi comprovado que o fertilizante usado em cana-de-açúcar libera de 0,7% a 0,9% do gás. Este dado pode alavancar a produção da cultura e diminuir as barreiras internacionais ao etanol brasileiro. São poucos os dados referentes à emissão de oxido nitroso por meio de aplicação de nitrogênio, principalmente na cultura de cana-de-açúcar para as condições paulistas, podendo-se dizer que este é um estudo pioneiro.

De acordo com o pesquisador do IAC, Heitor Cantarella, há muito interesse neste tipo de informação para cana-de-açúcar porque um de seus principais produtos – o etanol – é usado para substituir combustíveis fosseis e, deste modo, reduzir as emissões de gases de efeito estufa. “Se as emissões de tais gases associadas ao processo de produção de cana forem altas, perde-se parte da vantagem de substituir a gasolina pelo etanol”, afirma Cantarella.

Uma das etapas no processo de cultivo da cana-de-açúcar é a aplicação de fertilizantes nos canaviais, em especial os nitrogenados, com o objetivo de suprir a necessidade de nitrogênio das plantas e melhorar a produtividade. “Quando aplicado no solo, parte do nitrogênio é transformado em óxido nitroso, um dos componentes dos gases do efeito estufa. Existe grande interesse em informações a respeito da pegada de carbono – medida do impacto das atividades humanas na liberação de gases do efeito estufa – principalmente nas condições de plantio no Estado de São Paulo, responsável por 60% da cana-de-açúcar brasileira” explica Cantarella, pesquisador do IAC, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

As pesquisas do grupo indicaram que a liberação do oxido nitroso nos canaviais de Piracicaba e Jaú, onde os estudos foram conduzidos, ficaram abaixo dos índices do IPCC e de outros trabalhos importantes que apontaram fatores de emissão ainda maiores – de 3% a 5% do nitrogênio das lavouras. Apesar de comemorar o indicador, Cantarella ressalta que o estudo avaliou também que nos canaviais com muita palha sobre o solo as emissões aumentaram. “Observamos que quanto maior a quantidade de palha, maior a emissão de óxido nitroso. Em canaviais com mais de 21 toneladas de palha por hectare, por exemplo, o fator de emissão foi de 2%. Porém, na maior parte dos canaviais, a quantidade de palha é inferior a esse valor, situação em que as emissões permaneceram dentro de padrões normais”, afirma.

A palha no canavial é decorrente da colheita mecanizada da cana-de-açúcar. Com a proibição de queimadas na colheita manual, as palhas são deixadas no campo e a cana passa a ser cultivada sobre elas. Segundo Cantarella essa prática traz como benefício a diminuição das perdas de água, a preservação da umidade de solo – importante principalmente na época de seca – e a reciclagem de nutrientes do solo. “Com essa descoberta, o setor sucroalcooleiro e os técnicos terão que decidir, por algum critério, se vão retirar parte da palha e usá-la para outros fins ou se vão deixar no solo para protegê-lo. Nesta decisão, devem ser pesados tanto os aspectos positivos quanto os negativos na retirada do material dos canaviais. O dados que obtivemos são uma informação a mais que deve ser pesada nesse processo de decisão”, afirma.

De acordo com o pesquisador do IAC, Marcos Guimarães de Andrade Landell, 70% dos canaviais brasileiros são colhidos por máquinas. Estima-se que nos próximos cinco anos o percentual chegue a 100%. Outra decisão do setor diz respeito ao uso ou não da vinhaça – subproduto do etanol aplicado nos canaviais como fertilizantes. A pesquisa do IAC, APTA, CTC e UFSCar revelou que as emissões de oxido nitroso atingiram cerca de 3% do nitrogênio do fertilizante quanto este foi aplicado em solo com vinhaça e alta concentração de palha. Esse processo ocorre porque a vinhaça e a palha são importantes fontes de carbono e acabam colaborando para que os micro-organismos presentes no solo provoquem a emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa. Outros estudos estão sendo realizados para confirmar esses resultados.

Para resolver esses impasses, os pesquisadores já começam a pensar em soluções. Uma delas seria a utilização de aditivos juntos aos fertilizantes, o que poderia encarecer os custos de plantio. Para a palha, segundo Cantarella, a alternativa seria evitar que grandes quantidades permanecessem por muito tempo no campo. “Temos que pensar em técnicas de manejo para tentarmos resolver essa situação. A palhada do canavial pode ser usada para produção de eletricidade ou até mesmo para produzir álcool de segunda geração, o chamado etanol de celulose, por isso, pode ser de interesse das usinas sua retirada, mesmo que parcialmente, do solo. No entanto, alguma palha tem que ser mantida”, explica o pesquisador do IAC.

“No mundo todo há interesse em dados a respeito dos bicombustíveis. Ter resultados nas condições de cultivo no Brasil é de extrema importância para evitar que pesquisadores de outros países utilizem dados obtidos em outros locais e que nem sempre refletem os padrões relativamente favoráveis em que se cultiva cana no Brasil. Com certeza, levantando essas informações, estamos produzindo conhecimento que será muito útil para tomada de decisões futuras, além de contribuir para se conhecer mais profundamente nosso sistema de produção de etanol. O Brasil é o maior exportador de açúcar do mundo. O etanol abastece 50% da nossa frota de carros. Esses dados são, portanto, de grande relevância para o País e em especial para São Paulo, Estado que produz 60% da cana brasileira”, afirma Cantarella.

Para chegar a essas conclusões, os pesquisadores avaliaram, desde 2010, experimentos em Jaú e Piracicaba, tanto na fase de plantio como na de rebrota da cana. De acordo com Cantarella, esses testes foram necessários porque nas duas fases há métodos e quantidades de aplicação de fertilizantes distintos. “No plantio o fertilizante é enterrado no solo em doses menores. Nas soqueiras, são aplicadas doses menores na superfície do solo”, explica.

Os estudos foram financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, além do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). O projeto teve a colaboração de 13 pesquisadores das seguintes instituições: UFSCar, Universidade de Maryland, IAC, Centro de tecnologia Canavieira (CTC), Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena), Universidade de São Paulo (USP), Embrapa Meio Ambiente, APTA e Universidade Federal de Pernambuco.

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