IAC completa 131 anos com três novas patentes

Há também duas novas cultivares, de tangerina e de feijão de tipo especial, que são os primeiros desenvolvidos no Brasil

26.06.2018 | 20:59 (UTC -3)
Carla Gomes

O Instituto Agronômico (IAC) comemora 131 anos nesta quarta-feira, 27 de junho de 2018, a partir das 9h, na fazenda Santa Elisa do IAC, em Campinas. Durante a cerimônia, será entregue o Prêmio IAC, que está na 25ª edição. Serão agraciados a pesquisadora Mariângela Cristofani-Yaly e o servidor de apoio, Ronaldo Eduardo da Silva.

Os últimos 12 meses reuniram várias conquistas, dentre elas três invenções do IAC que foram patenteadas junto ao Instituto Nacional de Propriedade Internacional (INPI). Duas patentes têm titularidade exclusiva do IAC e uma tem co-titularidade.

A primeira patente exclusiva do Instituto é referente ao sistema de corte de base pertencente ao ramo de máquinas agrícolas. A tecnologia proposta substitui, na cultura da cana-de-açúcar, o corte por impacto pelo corte por deslizamento, associado ao uso de lâminas serrilhadas. A invenção do IAC  reduz os danos causados pelo corte por impacto provocado pelo método até então existente.O novo sistema aumenta a longevidade do canavial, por causar menor dano à soqueira.

A invenção é uma novidade do ponto de vista técnico. “Pode ser adaptado em qualquer colhedora comercial, sem a necessidade de modificações na máquina, apenas trocam-se os discos e as lâminas”, afirma Mello. “O corte por impacto danifica as soqueiras e facilita o ataque de micro-organismos, que prejudicam a rebrota e reduzem a produtividade”, explica o pesquisador responsável pela pesquisa, Roberto da Cunha Mello.

O sistema anterior também prejudica a cana colhida, aumentando o volume de perdas (e o teor de impureza mineral) A tecnologia criada pelo IAC vem atender uma necessidade do Brasil, o maior produtor mundial de cana, que enfrenta perdas de 10% a 15% ocorridas com a colheita mecânica. E o tipo de corte adotado está entre os responsáveis por esses prejuízos.

A segunda patente exclusiva do Instituto refere-se à aplicação da molécula N-acetil-cisteína (NAC) para controle de doença de citros. A partir da descoberta feita pelo IAC, a molécula, conhecida no tratamento de infecções bacterianas nas vias aéreas de humanos, mostrou-se eficiente no controle de fitopatógenos dos citros, incluindo a Xylella fastidiosa e Xanthomonas citri. O ineditismo da pesquisa, conduzida pela pesquisadora Alessandra Alves de Souza, está no fato de o controle não ser feito com defensivos agrícolas convencionais, mas com a molécula N-acetil-cisteína (NAC), que é um análogo do aminoácido cisteína, benéfico para saúde humana. “Essa molécula nunca havia sido testada para combater doenças de plantas e a dose usada na planta é menor que a usada em seres humanos”, diz Alessandra.

Os pesquisadores avaliaram essa molécula como estratégia para inibir ou desagregar o biofilme bacteriano da Xylella fastidiosa, causadora da Clorose Variegada dos Citros (CVC), e o da Xanthomonas citri, causadora do cancro cítrico. O biofilme formado pela bactéria Xanthomonas fica na superfície das folhas e o constituído pela Xylella se instala dentro da planta, nos vasos do xilema. 

De acordo com a pesquisadora, no caso da Xanthomonas citri, esse biofilme protege as bactérias de estresses ambientais, entre eles o calor e raios UV, e de compostos antimicrobianos que possam afetar o desenvolvimento da bactéria, dentre eles o cobre, rotineiramente utilizado no controle químico da doença. 

A pesquisa buscou uma estratégia para retardar ou inibir a formação desse biofilme nas folhas cítricas antes da infecção, a fim de tornar a Xanthomonas mais vulnerável. Assim a bactéria ficaria mais suscetível aos estresses ambientais e aos compostos antimicrobianos. Consequentemente, seria reduzida também a quantidade de produtos químicos usados no manejo da doença.

Os resultados mostraram que o NAC não só reduziu a quantidade de bactérias (Xylella fastidiosa) capazes de colonizar o xilema das plantas, como também foi capaz de reverter os sintomas de plantas com CVC. “No caso da Xanthomonas, o NAC teve efeito de desprendimento da comunidade bacteriana que vive sobre as folhas e reduziu significativamente a população bacteriana assim como os sintomas e a progressão da doença”, explica. 

Devido aos resultados promissores do uso do NAC na agricultura visando um controle mais sustentável dessas duas doenças bacterianas de citros, a pesquisadora pós-doc que atuou no Centro de Citricultura do IAC nos projetos com o NAC, Simone Picchi, abriu uma Startup chamada CiaCamp (Da Ciência ao Campo), com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), dentro do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), constituindo a primeira empresa incubada no Centro de Citricultura do IAC. Além da aplicação em citros, a CiaCamp visa expandir a aplicação do NAC para outras culturas de importância econômica do estado de São Paulo.

Outra patente obtida pelo IAC é na área de óleo essencial e extrato vegetal para uso em composição odontológica. Chamada “Nanoemulsão de Lychnophora pinaster e seu uso”, essa patente foi obtida em co-titularidade com a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). A Lychnophora pinaster é uma planta nativa do Brasil, característica do bioma Cerrado. É popularmente conhecida como arnica-mineira. “É de ocorrência restrita no estado de Minas Gerais e largamente empregada pela população local na forma de extratos alcoólicos no tratamento de contusões, torções e hematomas”, afirma a pesquisadora responsável, Márcia Ortiz Mayo Marques.

A composição odontológica pode ser utilizada em pacientes que usam aparelho ortodôntico fixo e removível, por apresentar propriedades antimicrobianas contra micro-organismos presentes na cavidade bucal. De acordo com a pesquisadora, o estudo com a nanoemulsão do óleo essencial e extrato vegetal de Lychnophora pinaster demonstrou potente atividade antimicrobiana da planta contra a bactéria Streptococcus mutans, um dos principais agentes da cárie dentária e da placa bacteriana.

Este resultado levou ao pedido de patente de invenção junto INPI. A pesquisa foi desenvolvida pela então doutoranda, Vanessa Salvadego de Queiroz, sob orientação da professora da UNICAMP, Angélica Zaninelli Schreiber, e coorientação da pesquisadora do IAC.

Segundo Márcia, estudos científicos, em especial, com extratos orgânicos das partes aéreas da planta têm demonstrado também atividade anti-inflamatória, analgésica, antitumoral, cicatrizante, tornando-a ainda mais efetiva como enxaguatório bucal livre de álcool e em outros agentes químicos de uso odontológico.

O IAC mantém estudos focados na caracterização da diversidade genética e química de plantas, domesticação das espécies e atividade biológica dos óleos essenciais e extratos vegetais, em especial a atividade antimicrobiana. “O Brasil tem a maior diversidade vegetal do mundo, o que o coloca em situação privilegiada, consistindo em importante nicho de exploração econômica da biodiversidade brasileira, em especial, para o uso aromático e medicinal”, diz.

Segundo o diretor-geral do IAC, Sérgio Augusto Morais Carbonell, todos esses resultados estão relacionados ao novo ambiente de inovação criado no IAC e nos demais institutos da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA). “O decreto de regulamentação da Lei Paulista de Inovação e a política de inovação implantada pela APTA têm permitido a aproximação da pesquisa com os setores de produção de forma eficiente e juridicamente segura”, afirma.

Essa nova condição dos institutos tem viabilizado a elaboração de respostas às demandas do setor agrícola. “Esse novo modelo inverte o sentido da programação científica; a pesquisa sempre trabalhou com oferta de produtos e serviços, agora os esforços são direcionados para atender às demandas de agricultores e indústrias dos diversos segmentos”, diz.

Novas cultivares

Também no último ano, o Instituto Agronômico lançou a primeira tangerina totalmente desenvolvida no Brasil. A IAC 2019 Maria é a primeira cultivar de citros do IAC protegida no Serviço Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). A IAC 2019 Maria não é importada, não é mutação e não é derivada de outro material, segundo as pesquisadoras responsáveis pela pesquisa, Mariângela Cristofani-Yaly e Marinês Bastianel. A IAC 2019Maria resulta de melhoramento genético convencional.

A IAC 2019 Maria causa menor impacto ambiental graças à resistência à mancha marrom de alternaria, uma doença que requer várias aplicações de fungicidas, quando plantada em áreas com a presença do fungo. Esta doença afeta as principais variedades de tangerinas comercializadas no Brasil — a Ponkan e a Murcott.

“Estamos oferecendo um produto diferenciado para a citricultura paulista”, garante Cristofani-Yaly. Para o setor de produção, o principal destaque desta nova variedade é a resistência à mancha marrom de alternaria (MMA), uma doença específica das tangerinas, responsável por reduzir a produção do pomar em até 70%. Com essa característica, a IAC 2019Maria causa menor impacto ambiental, por diminuir ou até eliminar a necessidade de pulverização.

O citricultor também tem outro fator relevante para adotar a Maria: a alta produtividade. Ela produz 93 quilos, por planta, com frutos de maior calibre, o que agrega valor ao produto. A planta da IAC 2019Maria também tem menor porte, permitindo a instalação de mais pés por hectare, o que contribui para a ampliar a produtividade. Em média, cada planta produz 2,3 caixas. “A ideia é produzir o máximo por hectare, com qualidade”, diz a pesquisadora.

Além de reduzir custo de produção, suas características como menor número de sementes, coloração intensa e tamanho do fruto agregam valor ao fruto.

Para o consumidor a Maria tem várias qualidades: um sabor equilibrado entre o doce e a acidez, facilita a descasca e tem poucas sementes — tem média de dez sementes, enquanto a Murcott tem 20. A expectativa é que ela tenha boa inserção no mercado.

Outro resultado do IAC é a cultivar de feijão IAC Nuance, que vai contribuir com a abertura do mercado externo para os feijões brasileiros, já que o carioca somente é consumido internamente. A IAC Nuance é a primeira no Brasil com registro no Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) de grãos rajados tipo Cranberry. Até então, o que se cultivava desse feijoeiro no Brasil é material que vem de outros países. A IAC Nuance, ao contrário dos materiais importados, foi desenvolvida para apresentar bom desempenho agronômico em solo e clima brasileiros. O resultado é alta produtividade, com potencial que pode chegar até 4.130 quilos, por hectare, além de resistência à antracnose e tolerância ao Fusarium oxysporum, características que reduzem de 20% a 30% o controle químico feito com agrotóxicos. Essa redução reflete na diminuição do custo de produção e também do impacto ambiental.

Esse tipo de grão tem excelente aceitação no exterior e a IAC Nuance abrirá uma nova possibilidade de negócio nos mercados dos Estados Unidos, Canadá e Europa, em especial da Espanha e Itália.

Esse feijão de grãos especiais tem alto valor agregado. Os preços costumam ser o dobro do aplicado quando comprado ao tipo Carioca. Além disso, não sofrem tanta variação, o que permite ao agricultor fazer planejamentos. “O preço é mais previsível, o mercado futuro é mais garantido. O valor não oscila tanto como ocorre com o Carioca”, diz o pesquisador do IAC, Alisson Fernando Chiorato.

O ciclo precoce da IAC Nuance, em torno de 70 a 75 dias, representa agilidade na colheita e amplia a chance de colocá-la como outra opção de cultivo na propriedade. “Para o agricultor, a precocidade permite o giro rápido no negócio”, diz o pesquisador. Com grão mais arredondado, tem o formato que o mercado procura. “É um produto diferenciado, muito desejado pelas empresas que trabalham com exportação”, explica.

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