Graças à pesquisa, Mato Grosso terá limão tahiti resistente à gomose
Cientistas selecionam porta-enxertos adaptados às condições do estado e com boa produtividade
01.08.2022 | 15:08 (UTC -3)
Embrapa
O potencial do estado de Mato Grosso
para a produção de alimentos esbarra, para algumas culturas, na falta de
informação e de tecnologias apropriadas para as condições locais. Para a
citricultura, a falta de porta-enxertos resistentes à doença fúngica gomose era
um limitante. Mas essa realidade começa a mudar com uma pesquisa coordenada
pela Embrapa em parceria com o Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), a Empresa
Mato-Grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural (Empaer) e a Prefeitura de Guarantã do Norte.
A primeira fruta a ter resultados mais
consistentes é a lima ácida tahiti, conhecida pelos consumidores como limão
tahiti. Dois experimentos realizados em Sorriso (MT) e Guarantã do Norte (MT)
confirmaram que as características da copa são determinadas pelo porta-enxerto,
porém, os frutos não sofreram influência. Os ensaios geraram informações
relevantes sobre porta-enxertos que proporcionam maior vigor vegetativo e
volume de copa. Já a avaliação dos frutos mostrou que eles possuem as
características desejadas pela indústria e pelo mercado internacional,
possibilitando não só o atendimento ao mercado local, como também a exportação.
Os experimentos foram instalados em
2016, nos campi do IFMT nos dois municípios. Em Sorriso, no bioma Cerrado, e em
Guarantã do Norte, no bioma Amazônia. Ao todo, foram testados 14 porta-enxertos
entre opções comerciais e novos híbridos não comerciais desenvolvidos pela Embrapa Mandioca e Fruticultura (BA). Eles foram comparados com o
limoeiro cravo, porta-enxerto mais utilizado na cultura, mas que apresenta alta
suscetibilidade à gomose de Phytophthora.
De acordo com as avaliações, os
porta-enxertos comerciais citrumelo “Swingle” e os citrandarins “Índio” e “San
Diego” induziram os maiores volumes de copa e índice de vigor vegetativo. Já os
porta-enxertos TSKC x (LCR x TR) – 059 (BRS Bravo), em Sorriso, e LRF x (LCR x
TR) – 005, em Guarantã do Norte, induziram as menores alturas às copas da
limeira-ácida.
“Buscamos os materiais que vão alcançar
maior produtividade. No caso, serão aqueles que têm uma copa maior. Porém,
alturas menores facilitam todo o manejo e trato cultural. O que a gente almeja
é um porta-enxerto que, mesmo desenvolvendo um porte menor, tenha uma
produtividade maior”, explica o pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril, Givanildo Roncatto.
As avaliações são feitas a cada seis
meses, quando são mensurados altura da planta, diâmetro de tronco do
porta-enxerto, diâmetro do tronco do enxerto, relação de incompatibilidade
entre porta-enxerto e enxerto, diâmetro e volume de copa e o índice de vigor
vegetativo. A expectativa é que as medições continuem até que as plantas
completem dez anos.
Seis anos após o plantio, somente o
porta-enxerto testemunha apresentou sintomas de gomose. Porém, Roncatto diz que
é preciso ter cautela e que a observação continue para ter certeza de que
nenhum deles será suscetível à doença.
Segundo ele, é possível que, ao fim da
pesquisa, não seja indicado apenas um, mas quatro ou cinco porta-enxertos com
recomendação de uso na região. Esse resultado ampliará as possibilidades para
produtores locais, sobretudo considerando que Mato Grosso não tem ocorrência de
outras doenças de grande relevância na citricultura, como Citrus Greening, ou
Huanglongbing (HLB).
Frutos
Para garantir que os frutos produzidos
atinjam os parâmetros de qualidade de interesse para o mercado, a pesquisa
avaliou as limas ácidas tahiti produzidas nos dois experimentos. A partir do
quarto ano de plantio, quando começou a produção, foram levantadas informações
sobre comprimento, diâmetro e massa dos frutos; rendimento de suco, teor de
sólidos solúveis totais, acidez total titulável e vitamina C.
No experimento de Guarantã do Norte não
foi observada diferença entre os frutos produzidos sob diferentes
porta-enxertos. Com diâmetro médio de 59,48 milímetros (mm), os frutos colhidos
na safra 2020 estariam classificados como grandes nas Normas de Classificação da
Ceagesp, uma vez que estão acima de 56 mm. O peso médio de 116 gramas (g)
também é superior às 100 g preferidas pelo mercado.
Outro aspecto de destaque dos frutos
produzidos naquele município foi o teor de rendimento de suco, com 48,09% de
média, superior aos 35% exigidos para consumo in natura e aos 40%
exigidos pela indústria.
Já em Sorriso, houve diferença
estatística nos frutos produzidos sob os diferentes porta-enxertos, podendo
separá-los em dois grupos. Um, estatisticamente igual à testemunha e outro com
características um pouco inferiores. Entretanto, os dois grupos apresentaram
diâmetro e peso dentro das características desejadas pelo mercado. Em relação à
massa, o grupo que não diferiu da testemunha pesou em média 115,65 g e o outro
pesou em média 102,48 g. Já o diâmetro médio dos frutos foi de 58,33 mm, com
variação entre 55,05 mm e 60,55 mm. O rendimento de suco apresentou média de
39,14%, abaixo dos 40% demandados pela indústria.
“Em pesquisas como essa, o mais
importante é verificar que as características dos frutos não tiveram
interferência dos porta-enxertos. De maneira geral, os frutos produzidos em
Guarantã do Norte e em Sorriso atendem às demandas do mercado nacional em
termos de coloração, tamanho e quantidade de suco”, explica a pesquisadora da
Embrapa Sílvia Campos.
Limão tahiti em Mato Grosso
Embora seja uma potência agrícola e
líder nacional na produção de grãos e carne, Mato Grosso é insuficiente na
produção de hortaliças e frutas. No caso dos citros, de acordo com o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o estado produz apenas cinco mil toneladas,
em aproximadamente 700 hectares (ha). Dessa área, apenas 341 ha são cultivados
com limões e limas-ácidas. A produção não é suficiente para atender ao mercado
interno, sendo necessário importar de outros estados brasileiros.
Um dos entraves para a produção de
citros é a ausência de porta-enxertos adaptados às condições de clima e solo do
estado. O limoeiro cravo, porta-enxerto usado em cerca de 80% dos pomares
comerciais, é altamente suscetível à infecção e à disseminação do fungo
causador da gomose dos citros, apesar de ser tolerante à seca, desenvolver-se
bem em solos arenosos, apresentar tolerância à tristeza dos citros, induzir à
precocidade e à alta produtividade e gerar frutos de qualidade.
A viabilização de outras opções de
porta-enxertos resistentes à doença, com bom potencial produtivo e com frutos
de qualidade, abre possibilidades de produção por agricultores familiares da
região Norte do estado.
De acordo com o extensionista da Empaer
Thiago Tombini, o limão tahiti é cultivado na região geralmente em pequenas
propriedades, com tamanho de até 5 ha e até 100 plantas. Porém, no município de
Sinop há produtor com mais de mil pés, a maior parte já com mudas produzidas
pela Empaer com porta-enxertos usados na pesquisa.
A produção atual é toda absorvida pelo
mercado local, porém, insuficiente para suprir a demanda de cidades emergentes
como Sinop, Sorriso, Lucas do Rio Verde, Nova Mutum e outras regiões do estado.
A viabilização de novas rotas de escoamento da produção permite até mesmo se
pensar em exportação. O município de Guarantã do Norte, por exemplo, está a 765
km do porto de Miritituba (PA), enquanto a distância até a Ceagesp, em São
Paulo, é de 2.200 km.
Porém, para a exportação e atendimento
a mercados maiores, será necessária a reunião de pequenos produtores em
cooperativas, de forma a organizar a oferta, mantendo a regularidade de
fornecimento demandado pelo mercado.
Pesquisa, ensino, extensão e
solidariedade
A parceria entre a Embrapa e o
Instituto Federal de Mato Grosso traz resultados maiores do que somente o
avanço do conhecimento e desenvolvimento de tecnologias para os produtores. Ao
instalar os experimentos nos campi da instituição de ensino, o projeto permite
ampliar a aprendizagem dos alunos.
De acordo com o professor Sandro
Caravina, em Guarantã do Norte, os alunos do segundo ano do curso técnico em
Agropecuária são responsáveis por desenvolver atividades no projeto e
participam de aulas práticas que incluem podas, controle de doenças, manejo
integrado de pragas e colheita. Além do aprendizado, a turma fica com metade da
renda da comercialização para ser usada no custeio da formatura. A outra metade
é usada para compra de insumos e ferramentas para aplicação na própria
pesquisa.
“Dentro do projeto já foram feitas
ações de extensão e de pesquisa. Visitamos produtores para fazer assistência
técnica, levamos os resultados para eles e os trazemos para conhecerem o
experimento e o manejo que é feito”, explica o professor Caravina, que
desenvolve seu doutorado com a lima ácida tahiti.
O professor conta que cerca de um terço
da produção é doada para instituições que prestam assistência social no
município.
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