Feromônio sexual de inseto transmissor do greening é identificado

​Com apenas 2 milímetros de comprimento, o inseto conhecido como psilídeo asiático (Diaphorina citri) tem apavorado citricultores no Brasil, China e Estados Unidos

24.01.2018 | 21:59 (UTC -3)
Elton Alisson

Com apenas 2 milímetros de comprimento, o inseto conhecido como psilídeo asiático (Diaphorina citri) tem apavorado citricultores no Brasil, China e Estados Unidos. Isso porque atua como vetor das bactérias causadoras do greening, doença com potencial de devastar pomares de citros – também conhecida como HLB, de huanglongbing, que significa “dragão amarelo” em chinês.

A fim de evitar que o inseto infecte novamente um pomar após a erradicação das plantas afetadas, tem sido recomendado aos agricultores monitorar as populações da praga de modo a identificar os locais onde está presente e pulverizá-los. Não existia, contudo, um sistema adequado para realizar esse mapeamento.

Agora, um grupo de pesquisadores vinculados ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Semioquímicos na Agricultura– um dos INCTs apoiados pela FAPESP e pelo CNPq no Estado de São Paulo – identificou e sintetizou o feromônio sexual do psilídeo asiático. A substância pode servir de “isca” em armadilhas para atrair e matar o inseto, impedindo o acasalamento.

A descoberta, feita por cientistas da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), da University of California, Davis, nos Estados Unidos, e do Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), foi publicada em um artigo na Scientific Reports.

“A descoberta e a síntese do feromônio sexual desse inseto abrem a perspectiva de monitorar e controlar mais eficientemente suas populações e, dessa forma, diminuir a incidência da doença”, disse José Roberto Postali Parra, professor da Esalq-USP e coordenador do INCT de Semioquímicos na Agricultura, à Agência FAPESP.

Os pesquisadores do INCT têm tentado desde 2009 identificar o feromônio sexual do psilídeo asiático justamente com o objetivo de utilizá-lo como isca em armadilhas para atrair o inseto.

Para atingir esse objetivo, eles começaram a estudar seu comportamento e fazer extrações de substâncias químicas envolvidas na comunicação (semioquímicos). O comportamento complexo e a biologia do inseto, entretanto, dificultavam o isolamento de seus semioquímicos.

“Desde o início, percebemos que seria muito difícil identificar o feromônio sexual do psilídeo asiático, uma vez que o comportamento do inseto é muito difícil e os semioquímicos presentes nele estão em quantidades muito pequenas”, disse José Maurício Simões Bento, professor da Esalq-USP e um dos pesquisadores principais do INCT de Semioquímicos na Agricultura.

A fim de superar essas barreiras, os pesquisadores do INCT se associaram a Walter Leal, professor da University of California, Davis, e a colegas do departamento de pesquisa e desenvolvimento do Fundecitrus e redobraram os esforços de pesquisa.

Inicialmente, desenvolveram um sistema inovador de criação de psilídeos asiáticos em laboratório. Os insetos foram criados em uma estufa com mudas de jasmim-laranja (Murraya paniculata) e com temperatura, luminosidade e umidade relativa que reproduzem as condições naturais encontradas pelo psilídeo asiático em sua atividade de voo na maioria dos campos de citros no Brasil. Os adultos que emergiam da colônia foram coletados e separados por sexo para análise do comportamento sexual.

Foi observado que os insetos começaram a acasalar quatro dias após surgirem, copularam mais com sete dias de idade e que as fêmeas virgens ou acasaladas liberavam um feromônio que atraía machos virgens. Com base nessas constatações, os pesquisadores começaram a tentar isolar e identificar os componentes desse feromônio sexual.

As análises químicas dos compostos isolados indicaram que a substância química do feromônio sexual liberado pelas fêmeas virgens do inseto era acetato de lignocerol.

A fim de testar se o composto era eficiente para atrair insetos em campo, foram realizados testes em pomares em Araraquara, no interior de São Paulo, região que apresenta alta incidência de greening. Nos testes, foram utilizadas diferentes doses da substância como isca em armadilhas adesivas amarelas, cor que atrai o inseto.

Os resultados dos experimentos demonstraram que a captura de insetos nas armadilhas com a substância como isca não foi significativamente maior do que a das armadilhas sem o composto nas primeiras semanas de experimentos.

As armadilhas que permaneceram entre 35 e 42 dias no campo liberando o feromônio, entretanto, capturaram mais insetos machos do que as sem o composto e, após esse período, perdiam a atividade.

Ao analisar os compostos voláteis das iscas que ficaram mais tempo em campo foram detectadas pequenas quantidades de ácido acético. A constatação levantou a hipótese de que, embora quimicamente estável, o acetato de lignocerol poderia sofrer degradação lenta sob condições de campo e que o ácido acético seria o produto dessa degradação e a substância que atrai os psilídeos asiáticos machos.

A fim de corroborar ou derrubar essa hipótese, os autores do estudo analisaram os compostos voláteis liberados pelo inseto no momento correspondente ao pico do acasalamento. Os resultados confirmaram que o ácido acético foi facilmente detectado nessa circunstância.

Por sua vez, os testes de avaliação de respostas do inseto obtidos em suas antenas (respostas eletroantomenográficas) e olfativas à exposição ao ácido acético revelaram que os machos foram atraídos pela substância química. E testes em campo mostraram que armadilhas com ácido acético como isca capturaram significativamente mais machos do que armadilhas sem o composto.

Baixo custo de aplicação

Surpreendentemente, as armadilhas com ácido acético também capturaram mais fêmeas do que as sem a substância, possivelmente devido a estímulos físicos emitidos por machos capturados, ponderaram os pesquisadores.

“Pretendemos avaliar agora o número de armadilhas necessárias por área em pomares de citros e fazer uma correlação com os insetos atraídos pelas armadilhas para verificar a diminuição da incidência da doença e mapear os locais infectados”, disse Bento.

Segundo o pesquisador, a ideia é que o composto dure pelo menos 30 dias em campo para atrair insetos para as armadilhas adesivas, de modo que os agricultores possam obter amostragens semanais de captura para quantificar e avaliar a presença da praga. “Nosso objetivo é que esse feromônio possa ser utilizado a um custo mais baixo possível pelos citricultores para controlar a doença”, disse Bento.

No Brasil, onde o greening surgiu em 2004, cerca de 46,2 milhões de árvores de citros – que representam 26% das árvores plantadas atualmente – foram erradicadas desde então. Em São Paulo, o maior produtor de laranjas do país, 17% dos laranjais foram afetados.

No estado da Flórida, nos Estados Unidos – maior concorrente mundial do Brasil na produção de laranja e onde a doença surgiu em 2005 –, o greening já atingiu entre 80% e 90% dos pomares. Com isso, os produtores da região, que há 15 anos produziam 240 milhões de caixas de laranja por ano, passaram a produzir 150 milhões de caixas e devem produzir este ano 68,7 milhões de caixas.

A previsão do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês) é que a produção de laranja em 2025 pela Flórida será de apenas 27 milhões de caixas.

“O greening é hoje a doença mais importante que afeta a citricultura mundial. As plantas de citros infectadas não têm cura e precisam ser erradicadas”, disse Parra.

O artigo Putative sex pheromone of the Asian citrus psyllid, Diaphorina citri, breaks down into an attractant (doi: 10.1038./s41598-017-18986-4), de Odimar Z. Zanardi, Haroldo X. L. Volpe, Arodi P. Favaris, Weliton D. Silva, Rejane A. G. Luvizotto, Rodrigo F. Magnani, Victoria Esperança, Jennifer Y. Delfino, Renato de Freitas, Marcelo P. Miranda, José Roberto P. Parra, José Mauricio S. Bento e Walter S. Leal, pode ser lido na Scientific Reports em www.nature.com/articles/s41598-017-18986-4

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