Cientistas apontam que formigas realizam amputações de membros para sobreviver

A taxa de sucesso do procedimento é impressionante: cerca de 90% dos animais amputados sobrevivem ao tratamento

03.07.2024 | 11:28 (UTC -3)
Revista Cultivar
Formiga amputando perna
Formiga amputando perna

Pesquisadores descobriram que as formigas carpinteiras da Flórida (Camponotus floridanus) exibem um comportamento até então conhecido apenas em humanos: a amputação de membros como medida preventiva para salvar a vida de companheiras feridas. Em casos de lesões nas pernas, essas formigas mordem e removem completamente os membros afetados.

Essa prática brutal impede que infecções perigosas espalhem-se pelo corpo das formigas. A taxa de sucesso do procedimento é impressionante: cerca de 90% dos animais amputados sobrevivem ao tratamento. Mesmo com a perda de uma de suas seis pernas, as formigas conseguem retomar suas funções normais no ninho.

A pesquisa, conduzida por cientistas da Julius-Maximilians-Universität (JMU) em Würzburg, Alemanha, e da Universidade de Lausanne, Suíça, revelou um detalhe curioso: as formigas só realizam amputações quando as lesões ocorrem nas coxas (fêmures). Lesões nas canelas (tíbias), por outro lado, nunca resultam em amputação. Nesses casos, as formigas intensificam os cuidados, lambendo as feridas para remover bactérias, o que resulta em uma taxa de sobrevivência de cerca de 75%.

Para entender por que as formigas não amputam pernas feridas nas canelas, os pesquisadores realizaram amputações em formigas com ferimentos e infecções bacterianas nessas áreas. O resultado foi surpreendente: a taxa de sobrevivência após a amputação foi de apenas 20%. Exames tomográficos mostraram que os músculos das coxas são essenciais para a circulação da hemolinfa (equivalente ao sangue humano). Já nas canelas, a ausência desses músculos críticos permite que bactérias se espalhem rapidamente pelo corpo, tornando a amputação ineficaz.

Segundo Erik Frank, biólogo da JMU, "os ferimentos nas coxas prejudicam os músculos e dificultam a circulação, retardando a disseminação de bactérias. A amputação é eficaz nesses casos, se realizada rapidamente." Laurent Keller, da Universidade de Lausanne, acrescenta que "nosso estudo prova pela primeira vez que animais também utilizam amputações profiláticas no tratamento de feridas, ajustando o tratamento ao tipo de lesão."

As formigas carpinteiras da Flórida, nativas do sudeste dos EUA, são grandes, medindo até 1,5 cm de comprimento, e vivem em madeira apodrecida. Elas defendem vigorosamente suas colônias contra rivais, e ferimentos em confrontos são comuns. A escolha dessas formigas para o estudo se deu pela ausência da glândula metapleural, que em outras espécies produz secreções antibióticas. Esta ausência levantou questões sobre como elas combatem infecções, levando à surpreendente descoberta das amputações específicas por tipo de lesão.

O estudo resultado em artigo científico com o seguinte resumo:

"As feridas abertas representam grandes riscos de infecção e mortalidade em animais. Para reduzir esses riscos, muitas espécies animais aplicam compostos antimicrobianos em suas feridas. As sociedades de formigas usam secreções antimicrobianas da glândula metapleural para combater patógenos, mas esta glândula foi perdida ao longo do tempo evolutivo em vários gêneros, incluindo Camponotus.

Para entender como as feridas infectadas são tratadas sem o uso de secreções antimicrobianas da glândula metapleural, realizamos análises comportamentais e microbiológicas experimentos em Camponotus floridanus. Quando ferimos experimentalmente a perna de uma operária no fêmur, as companheiras de ninho amputaram o membro ferido mordendo a base (trocânter) da perna até que ela fosse cortada, aumentando assim significativamente a sobrevivência em comparação com as formigas que não receberam amputações.

No entanto, quando a lesão experimental foi mais distal (na tíbia), as companheiras de ninho não amputaram a perna e, em vez disso, direcionaram mais cuidados com a ferida para o local da lesão. As amputações experimentais também não conseguiram melhorar a sobrevivência em formigas com lesões infectadas na tíbia, a menos que a perna fosse amputada imediatamente após a exposição ao patógeno. As microtomografias revelaram que os músculos provavelmente responsáveis ​​pela circulação da hemolinfa nas pernas estão predominantemente no fêmur. Assim, é provável que as lesões do fêmur, ao atenuarem o fluxo da hemolinfa, proporcionem tempo suficiente para os trabalhadores realizarem amputações antes da disseminação do patógeno.

No geral, este estudo fornece o primeiro exemplo do uso de amputações para tratar indivíduos infectados em um animal não humano e demonstra que as formigas podem adaptar o seu tipo de tratamento dependendo da localização das feridas.”

Mais informações em doi.org/10.1016/j.cub.2024.06.021

No vídeo acima, formiga realizando amputação (fonte: doi.org/10.1016/j.cub.2024.06.021).

No vídeo acima, formiga cuidando de ferimento (fonte: doi.org/10.1016/j.cub.2024.06.021).

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