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Pesquisadores do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo (Cena-USP) revisaram 1.154 artigos científicos originais, publicados entre 2009 e 2022, que tratam do efeito de nanomateriais sobre 1.374 plantas de 253 espécies. O objetivo foi capturar (de forma quantitativa) e organizar os parâmetros experimentais empregados pela comunidade científica, além dos resultados obtidos ao longo da última década.
Com os metadados – dados gerados a partir de outros já publicados na literatura – o grupo de autores sistematizou quais são os nanomateriais mais utilizados, em que tipo de ambiente as plantas são expostas, quais órgãos vegetais são mais expostos aos tratamentos e quanto tempo duram os estudos. Além disso, mostraram os percentuais de tratamentos à base de nanomateriais que causaram efeitos positivos, negativos ou ambos – além daqueles que não afetaram as plantas.
O trabalho recebeu financiamento da FAPESP por meio de oito projetos (20/07721-9, 20/11178-9, 20/11546-8, 17/16375-4, 15/05942-0, 16/50014-6, 22/03399-0 e 17/21004-5). As conclusões foram publicadas na revista Environmental Science: Nano, da Royal Society of Chemistry.
“Se queremos de fato explorar as propriedades de nanomateriais para aumentar a produtividade das culturas, ou acessar o potencial de risco que podem oferecer ao ambiente, nós precisamos planejar e executar adequadamente os estudos”, explica Hudson Wallace Pereira de Carvalho, principal autor do trabalho. “Os resultados obtidos em um dado experimento dependem de como ele foi conduzido”, complementa Carvalho, que se doutorou em química pela USP e pela Universidade Paris XI.
A pesquisa verificou, por exemplo, que 71% dos estudos não utilizaram controles positivos. Mas ao avaliar o efeito de uma dada nanopartícula também se deveria tentar incluir partículas micrométricas ou compostos solúveis com composição química análoga. “O desacoplamento de efeitos oriundos de propriedades nanométricas daqueles causados por íons ou micropartículas poderia ser facilitado por essa estratégia”, explica Carvalho.
Outra questão abordada foi a concentração de nanomateriais a que as plantas são expostas. “Notamos que para um dado elemento químico as concentrações são, em geral, maiores do que aquelas às quais as plantas estão expostas naturalmente no ambiente ou aquelas às quais são expostas em ambientes de produção agrícola”, diz o pesquisador. Isso leva a outra questão: os efeitos obtidos, especialmente os negativos, derivam das concentrações elevadas ou realmente de propriedades do mundo nanométrico?
Além disso, constatou-se que os estudos são curtos quando se comparam sua duração e o ciclo de vida das culturas. A mediana da duração da maioria dos experimentos foi de 49 dias para plantas cultivadas em solo, o que é bem pouco em comparação aos ciclos anuais dos cultivos, de 90 a 120 dias. Ou seja, a minoria dos estudos avalia o impacto dos tratamentos à base de nanomateriais sobre a produtividade e a qualidade da produção. E poucos experimentos (6%) foram realizados em condições de campo (que requerem grande esforço). Em um experimento de campo, as variáveis de clima, patógenos e solo se alteram de um local para o outro. Logo, para ter validade, deve ser instalado em locais diferentes e mesmo por mais de uma safra, aponta o artigo. Por outro lado, antes da aplicação de nanopartículas na lavoura é preciso muito cuidado com experimentos bem estabelecidos em casas de vegetação, para não espalhar substâncias potencialmente tóxicas no ambiente.
O grupo também verificou que apenas 19% dos estudos em que nanopartículas foram aplicadas no solo avaliaram se elas causam algum impacto sobre microrganismos. “Estes últimos são componentes essenciais para a manutenção da fertilidade do solo”, adverte Carvalho.
“É difícil tirar conclusões das razões pelas quais os experimentos foram conduzidos dessa forma. Por outro lado, nossa metanálise aponta oportunidades e direções que podem ser interessantes de se seguir”, diz o pesquisador. “Claramente, trata-se de uma área de conhecimento multidisciplinar relativamente recente e ainda há muito a ser estudado.”
Por exemplo, é conhecido que algumas propriedades são mais pronunciadas em partículas menores do que 29 nanômetros. O estudo revela que cerca de metade dos tratamentos estava acima dessa fronteira. “Isso pode sinalizar que ainda estamos tentando entender como o tamanho das partículas afeta as plantas.”
As observações apontam para a intrincada relação entre a capacidade de inferir conclusões e o desenho experimental empregado, conclui o estudo.
A visão abrangente e atualizada dos efeitos dos nanomateriais nos sistemas vegetais levanta a questão de se estes levarão a ganhos incrementais de rendimento ao substituir insumos atuais por outros baseados em nanotecnologia, como a liberação controlada de fertilizantes e pesticidas, ou se poderão revolucionar a agricultura atacando problemas até agora não abordados na prática, como “driblar” os estresses e os mecanismos de defesa das plantas, ou modular seu metabolismo.
O artigo Are nanomaterials leading to more efficient agriculture? Outputs from 2009 to 2022 research metadata analysis, assinado por outros 14 pesquisadores de seis diferentes instituições, pode ser lido acessando aqui.
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