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No Brasil, aproximadamente 75% da produção de arroz é proveniente do agroecossistema terras baixas do Rio Grande do Sul, onde predomina a orizicultura irrigada por inundação. Parte significativa desta produção pode ser atribuída à elevada capacidade e estabilidade produtiva, à qualidade de grãos das cultivares e à adoção de boas práticas agrícolas que ampliam o nível tecnológico das lavouras.
O planejamento do manejo integrado das práticas agrícolas é feito de modo a atribuir maior chance de sucesso ao controle preventivo ou o escape das doenças do arroz, reduzindo os riscos de perda de produtividade. Portanto, se constitui em sistema de alta eficiência, flexível e dinâmico para o controle das doenças, incluindo estratégias que reduzem o inóculo inicial e a taxa de progressão no campo, integradas a outros métodos (biológico, cultural, químico, cultivares resistentes), que têm por objetivo manter a taxa de severidade abaixo do limiar de dano econômico, com o mínimo de efeito nocivo ao ambiente. Tal sistema, ao eliminar a interferência de interações de efeitos negativos aos arrozais, indiretamente, condiciona melhor expressão do potencial produtivo das cultivares, que é de maior interesse dos orizicultores.
Quando as doenças da cultura do arroz se manifestam, há risco de menor produtividade, da sanidade das sementes e da qualidade dos grãos. Entre as doenças do arroz, destaca-se a brusone (Pyricularia oryzae) devido ao alto potencial para danificar plantas de cultivares suscetíveis, reduzindo drasticamente a lucratividade.
A brusone pode se estabelecer em distintas partes da planta de arroz, como folhas, colmos, bainhas e sementes, sendo o sintoma das manchas foliares o mais típico. Nas folhas, os sintomas iniciais consistem de pequenos pontos, de aproximadamente 1mm de diâmetro, cor castanho, passando a castanho-avermelhado, rodeados por um halo amarelado. Evoluem para uma lesão alongada, com bordos irregulares e de coloração marrom, com centro grisáceo, onde aparecem as frutificações do fungo (Figura 1). Em condições de alta umidade, na fase de floração, pode ocorrer infecção do primeiro nó, abaixo da panícula, esterilizando todas as espiguetas, que é a situação mais comum da brusone de panícula, conhecida como brusone de pescoço.
A infecção do pescoço geralmente é considerada a condição mais deletéria da doença, devido aos danos nessa parte da planta reduzirem a formação de grãos em toda a panícula. Por isso, a produtividade de arroz é estreitamente relacionada à severidade da brusone de pescoço. Neste contexto, estudos demonstraram que a cada 1% de brusone de pescoço há uma perda de 0,5% de produtividade. Além disso, a infecção tardia da panícula na fase de grão leitoso pode causar gessamento e reduzir o rendimento de grãos inteiros.
No Rio Grande do Sul, a epidemia de brusone tem sido maior nos últimos anos, devido à semeadura de grande escala de cultivares suscetíveis. Dentre dez cultivares mais usadas na safra 2014/2015, 70% são suscetíveis à doença, ocupando uma área de aproximadamente 800 mil hectares. Esta epidemia se intensifica quando são usadas elevadas doses de fertilizantes, principalmente de nitrogenados. Associado a esta situação, o número de aplicações de fungicidas aumentou aproximadamente 700%, em mais de 50% das lavouras do Rio Grande do Sul, o que perdura até o presente. Isso, provavelmente, induziu ao aumento de epidemia, associado ao surgimento de mais raças do fungo P. oryzae, o que reduz o período da resistência (vida útil) das cultivares.
Para manejar a brusone é recomendado um adequado preparo do solo, com eficiente incorporação de restos culturais, utilização de semente certificada, em épocas e densidades corretas de semeadura, adubação equilibrada, principalmente a nitrogenada, irrigação por inundação uniforme e controle eficaz de plantas daninhas. Este manejo é otimizado via uso de cultivares de arroz resistentes, um método agronomicamente eficiente, econômico e ambientalmente mais seguro para o controle da doença.
Constata-se que a reação de resistência de cultivares à brusone é inversa à ação de controle por fungicida. Ou seja, quanto maior o grau de resistência da cultivar, menor é a contribuição do fungicida no controle da brusone, ocorrendo, consequentemente, maior ação de controle (interação fungicida/resistência), reduzindo o número de aplicações. Assim, quanto mais suscetível for a cultivar, maior a necessidade de haver planejamento das ações de controle, como semear mais cedo, pois o avanço das épocas de semeadura do arroz aumenta a severidade da brusone, e outras medidas, que aumentam a responsabilidade com o monitoramento da doença e do clima (umidade e temperatura) para estabelecer o limiar de ocorrência da brusone (risco de epidemia). Portanto, há necessidade de estabelecer um equilíbrio, todas as vezes que for tomada uma decisão de alterar, modificando este manejo, como nas escolhas das cultivares suscetíveis, no emprego de adubação pesada de cobertura, que aumenta o estresse no sistema. Portanto, há necessidade de compensar ou intensificar ação em outras medidas ou métodos que auxiliem no controle das doenças.
A aplicação de fungicidas nas lavouras de arroz irrigado do Rio Grande do Sul, com base em diagnóstico da situação da brusone, utilizando doses registradas, em época correta, proporciona maior eficiência de controle, podendo resultar em menor número de pulverizações e maior economicidade. Entretanto, esse controle pode ser mais eficiente e econômico ainda se procedido por boas práticas de manejo da cultura.
De modo geral, todos os fungicidas registrados para controle de brusone na cultura do arroz irrigado foram e são estudados quanto à sua eficiência, com duas aplicações, durante período reprodutivo das plantas, sendo a primeira no emborrachamento tardio (até 5% de emissão de panículas) e a segunda 15 dias após, de acordo com poder residual e a dose recomendada pelo fabricante.
Em situação de região que possua histórico de ocorrência de epidemia baixa, ou seja, baixa severidade de brusone, o que é frequente em lavoura de arroz do Sul do Rio Grande do Sul, os resultados evidenciaram que uma aplicação de fungicida, na fase fenológica de emborrachamento (R2), é suficiente para controlar a doença e assegurar a capacidade produtiva das cultivares, o que se equipara com duas e três aplicações, nos estádios de emborrachamento + floração e emborrachamento + floração + grão leitoso, respectivamente (Tabela 1).
Aos benefícios agronômicos e econômicos de apenas uma aplicação de fungicidas, somam-se os ambientais e alimentares. As aplicações de fungicidas mais tardias são ineficientes no controle da doença, ao ponto de não impedirem que a doença atinja severidade semelhante à constatada em plantas não tratadas.
Por outro lado, quando o controle da brusone é baseado em métodos por previsão, as plantas de arroz devem ser protegidas antes do surgimento nas panículas ou da ocorrência de condições climáticas favoráveis à doença por períodos superiores à duração do efeito residual dos fungicidas (dez-18 dias). Dependendo da situação da doença, deve-se decidir pela necessidade ou não de uma segunda aplicação. Em casos de dúvida, deve ser considerado que o período que abrange as fases de emborrachamento tardio e o início da emissão das panículas é aquele em que são obtidos melhores efeitos das aplicações de fungicidas (Tabela 1). Poderá também, ser adotada uma tática de aplicação mista, em áreas com histórico de ocorrência da brusone, realizando a primeira pulverização por calendário fixo, no final do emborrachamento, e a segunda por previsão empírica (sob a probabilidade de ser atingido o limiar de ocorrência da doença), de modo a impedir o estabelecimento de danos econômicos.
Há fortes indicativos de correlação entre a produção de arroz irrigado e a severidade de brusone nas panículas, sendo atingida maior produtividade da cultura quando as plantas são tratadas com fungicidas (Tabela 1 e Figura 2).
Com base nesse indicativo de correlação, foi estimada a viabilidade econômica (lucratividade) de um maior ou menor número de aplicações (Tabela 2), utilizando as seguintes informações: severidade de brusone nas panículas (Tabela 1); doses, custos da aplicação aérea e preço médio atual (litro ou quilo) das marcas comerciais de fungicidas contendo triciclazol (R$ 235,00) e trifloxistrobina + tebuconazol (R$ 70,00); preço atual da saca de arroz de 50kg (R$ 40,00).
As maiores produtividades simuladas corresponderam a uma, duas e três aplicações dos fungicidas, em R2 (emborrachamento), R2 + R4 (emborrachamento + floração), e R2 + R4 + R6 (emborrachamento + floração + grão leitoso), respectivamente, superando em 1t/ha a produtividade associada ao tratamento testemunha. A indicação de que a aplicação única de fungicidas em R2 viabiliza uma produtividade igual à atribuída a duas e três pulverizações mais tardias, tem base na evidência de que tratamentos no estádio de emborrachamento e floração são mais efetivos no controle da brusone, assegurando níveis normais de produtividade. Portanto, dependendo da severidade da doença, que pode variar conforme a safra, a região orizícola, a cultivar utilizada e as práticas de manejo da cultura, dentre outros fatores, é possível reduzir o número de aplicações de fungicidas, com impacto positivo nos custos de produção e qualidade de recursos naturais, e menor risco de acúmulo de resíduos nos grãos.
Portanto, considera-se que cultivares resistentes à brusone são relevantes para o manejo da doença em arrozais irrigados, associado ao fato de que em determinadas regiões orizícolas há histórico de baixa severidade. Assim, evidencia-se que, com base em monitoramentos, apenas uma aplicação de fungicida, no emborrachamento (R2), é suficiente para o controle da doença e manutenção da produtividade, aumentando o nível tecnológico de arrozais irrigados.
Cley Donizeti Martins Nunes e José Francisco da Silva Martins, Embrapa Clima Temperado
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