Incluir o algodão como parte de um sistema produtivo, de maneira a reduzir os custos de produção. Esse é a estratégia que vem sendo demonstrada pela Embrapa em um trabalho desenvolvido em parceria com o Instituto Mato-grossense do Alodão (IMAmt) e o Grupo Nadiana, na fazenda Cariji, no município de Ipiranga do Norte (MT).
Há três safras pesquisadores de diferentes especialidades da Embrapa Algodão, Embrapa Agropecuária Oeste e Embrapa Agrossilvipastoril monitoram uma Unidade de Referência Tecnológica e Econômica com cerca de 150 hectares na fazenda. No local é comparado o manejo convencional feito pela propriedade com o manejo preconizado pelos pesquisadores. A maior diferença entre uma área e outra é o sistema produtivo. Enquanto uma mantém a sucessão soja-algodão, mais comum em Mato Grosso, em outra o algodão é visto como parte de um sistema que conta com rotação com milho e braquiária.
Com esse sistema, pesquisadores buscam aumentar a quantidade de palhada e de matéria orgânica no solo, reduzir a compactação, quebrar o ciclo de pragas e doenças, suprimir plantas daninhas, reduzir o número de aplicações por meio do manejo integrado, diminuir riscos para o produtor e, acima de tudo, reduzir os custos de produção.
“Sistema é a palavra chave. Não estamos considerando o sistema produtivo [nas lavouras em geral] e sim as coisas de maneira isolada. Nosso foco com esse trabalho é buscar melhorar a eficiência do processo. Deixar de pensar só na produtividade física e passar a pensar na eficiência dos processos”, disse o pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste Fernando Lamas em palestra realizada na última quinta-feira durante uma visita técnica à fazenda Cariji.
A palestra foi feita para uma plateia atenta formada por cerca de 40 técnicos que compõem o Grupo Técnico do Algodão (GTA) da regional de Sorriso. Com profissionais de municípios como Sorriso, Ipiranga do Norte, Vera, Tapurah e Sinop, o grupo se reuniu para conhecer o trabalho que vem sendo desenvolvido pela Embrapa em uma visita técnica.
Além da apresentação de Fernando Lamas, a programação contou com visita à Unidade de Referência Tecnológica e Econômica, onde pesquisadores falaram sobre o que estão avaliando no local, e visitas a diferentes lavouras em outra fazenda da região, onde também estão sendo feitos trabalhos visando o aumento da matéria orgânica e da palhada no solo.
De acordo com o presidente do GTA na região de Sorriso, Sirineu de Oliveira, o grupo hoje é formado por cerca de 120 profissionais, entre técnicos agrícolas, agrônomos e consultores. A união já tem quatro anos e visa à troca de informações e experiências. Para ele, a inclusão do algodão no sistema produtivo enfrenta resistência devido ao interesse na lucratividade imediata. Porém, os sinais de que é preciso mudar a forma de se fazer a cotonicultura já estão claros.
“Se você pegar do Paraná até a divisa com o Pará nós não temos rotação de culturas. Temos sucessão de culturas. Tira a soja e põe milho, ou tira a soja e põe algodão. Então isso aí vai ficar um sistema falido. Já temos algumas áreas de propriedades nossas mesmo que estão tendo muitos problemas de baixa produtividade por causa da sucessão de culturas. Tem áreas com mais de 20 anos com soja e algodão. Então o nematoide está muito presente, doenças como mancha alvo estão difíceis de controlar, ramulária está vindo mais cedo. Se a gente não tiver esse intervalo de ponte verde, futuramente vai ficar quase que inviável algumas culturas aqui em Mato Grosso”, prevê Sirineu.
Mesmo elencando problemas que já ocorrem na cultura do algodão, como a seleção de pragas e doenças, dificuldade no controle de plantas daninhas, compactação do solo, entre outros, o pesquisador Fernando Lamas reconhece a dificuldade em se fazer mudanças tendo em vista a lucratividade da cultura. Porém, de acordo com ele, é preciso ter visão de futuro. Medidas precisam ser tomadas para evitar que os custos já altos se elevem ainda mais, ou que pragas e doenças inviabilizem a produção no estado.
O chefe-geral da Embrapa Algodão, Liv Severino, atribui ainda a resistência em adotar práticas mais sustentáveis de produção à complexidade que isso acrescenta à rotina das fazendas.
“Os produtores já estão tendo um trabalho muito grande para cuidar de suas fazendas com o simples que estão fazendo. E cada vez que têm que adicionar mais variáveis, mais coisas complexas que eles têm de fazer, é uma dificuldade grande. Realmente não é simples. Na maioria das vezes eles só adotam as tecnologias quando é necessário mesmo, quando estão com dificuldades, baixa produtividade e custo alto”, afirma.
Avaliação junto ao produtor
Diante desse cenário de aumento da complexidade e também da falta de informações existentes sobre a forma de adoção de tecnologia mais sustentáveis, Liv destaca a importância de um trabalho de validação como este que vem sendo conduzido pela equipe da Embrapa.
“Temos várias ideias que funcionam em experimentos e agora estamos tendo a oportunidade de demonstrar em condições práticas. Não temos a condição de simular no campo experimental as mesmas condições de máquinas, produtos e procedimentos que a fazenda tem. Então essa é uma oportunidade para que a gente já teste junto com os produtores e um produtor passando para outro é muito mais efetivo do que nós dentro da Embrapa tentando passar diretamente para o produtor”, avalia o chefe-geral da Embrapa Algodão se referindo à transferência do conhecimento.
Embora as avaliações feitas na trabalho acompanhado pela Embrapa ainda estejam no início, e seja cedo para ter resultados conclusivos, os dados da safra passada já apontam uma redução de mais de R$ 700 no custo por hectare, mantendo uma rentabilidade semelhante.
Outros pontos que já começam a ser observados são a menor incidência de plantas daninhas, graças ao papel exercido pela braquiária, maior quantidade de palhada presente no solo, mesmo após a lavoura de soja e redução no número de pulverizações de inseticidas e herbicidas.
Por outro lado, alguns pontos ainda precisam ser melhor estudados, como por exemplo, a necessidade de maior aporte de nitrogênio devido ao consumo do nutriente no processo de decomposição do material orgânico.
O chefe-adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Agrossilvipastoril, Flávio Fernandes, destaca que mesmo sendo preliminares, os resultados já apontam para um caminho interessante que é o da redução de custo e consequentemente, de riscos para os produtores.
“Ainda tem muita coisa a ser feita. Precisamos dominar melhor esse trabalho com a matéria orgânica. Mas o que vemos até agora são informações muito importantes para a cadeia do algodão”, afirma.