Cientistas mostram que plantas competem por espaço nos polinizadores

Estudo comprova que flores como "Hypenea macrantha" utilizam mecanismos de catapulta para remover pólen de rivais e aumentar chances de reprodução

16.10.2024 | 15:55 (UTC -3)
Revista Cultivar

Cientistas do Brasil e da África do Sul forneceram evidências empíricas de que grãos de pólen de plantas rivais podem competir entre si por espaço nos polinizadores. Essa competição influencia quais pólens serão levados à próxima flor – ou não. O estudo sugere que as plantas desenvolveram estratégias para manipular o pólen em polinizadores de maneira similar à manipulação de esperma observada em animais.

Os cientistas explicam que, diferente dos animais -- que possuem contato direto durante o acasalamento --, as flores não interagem diretamente durante a reprodução. Portanto, a manipulação do pólen deve ocorrer nos polinizadores antes que o pólen chegue a outra flor.

No caso de Hypenea macrantha, uma flor vermelha encontrada no Brasil, os pesquisadores capturaram em vídeo de câmera lenta um experimento que simula esse mecanismo de competição. A flor usa um mecanismo similar a uma catapulta para remover efetivamente o pólen de flores rivais do bico do beija-flor e colocar seu próprio pólen no mesmo local.

Esse mecanismo, chamado de "colocação explosiva de pólen", não é inédito no reino vegetal. Contudo, é a primeira vez que os cientistas conseguem comprovar sua eficácia ao contar fisicamente o número de grãos de pólen rotulados removidos pela explosão. O professor Bruce Anderson, ecologista evolutivo da Universidade de Stellenbosch, destaca que essas descobertas provam a ideia de remoção competitiva de pólen entre plantas.

Segundo Anderson, as flores visitadas por beija-flores depositam seu pólen no bico do animal, mas o espaço é limitado. Para aumentar suas chances de sucesso reprodutivo, as flores evoluíram um mecanismo de catapulta que dispara o pólen no bico do beija-flor com força suficiente para remover o pólen previamente depositado por outras plantas. Assim, a flor pode colocar seus grãos em um local mais limpo, reduzindo a competição.

Os pesquisadores acreditam que essa estratégia é uma forma de competição entre plantas masculinas, similar ao que ocorre entre machos de algumas espécies animais. Anderson ressalta que a ideia de competição entre plantas dessa forma era impensável até pouco tempo atrás, justamente por não haver contato direto entre flores durante a reprodução.

O professor Vinícius Brito, botânico da Universidade Federal de Uberlândia e coautor do estudo, explica que anteriormente se pensava que o principal objetivo da explosão floral era auxiliar na colocação de pólen nos polinizadores ou até assustá-los para que voassem para outras plantas, promovendo a dispersão do pólen. No entanto, os novos dados sugerem que o mecanismo também desloca o pólen de flores anteriores, aumentando o sucesso reprodutivo masculino ao aumentar a competição por espaço nos corpos dos polinizadores.

Essa pesquisa revela formas inovadoras pelas quais as plantas competem por reprodução e destacam como os mecanismos evolutivos estão presentes em todos os aspectos da natureza, mesmo em relações aparentemente indiretas como a dos polinizadores e flores. Hypenea macrantha é um exemplo fascinante de como a evolução age para aumentar as chances de sucesso reprodutivo em ambientes de competição intensa.

Algumas curiosidades:

  • Cerca de 94% das plantas são hermafroditas, possuindo órgãos reprodutivos masculinos e femininos. Para evitar a autopolinização, as flores costumam passar por uma fase masculina antes de entrarem na fase feminina.
  • Após o disparo do pólen, as anteras de Hypenea macrantha se dobram para baixo, enquanto o estilete se alonga, iniciando a fase feminina da flor.
  • Vídeos em câmera lenta mostram que o pólen de Hypenea macrantha viaja a uma velocidade de 2,62 metros por segundo. Em comparação, o mecanismo de catapulta do pólen em amoreiras brancas ultrapassa os 170 metros por segundo, sendo o movimento mais rápido conhecido nos reinos vegetal e animal.

Mais informações podem ser obtidas em doi.org/10.1086/732797

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