Artigo - Embrapa desenvolve novas ferramentas e gera perspectivas para o controle do Greening

24.12.2008 | 21:59 (UTC -3)
Lúcio André de Castro Jorge

Na década de 80, o Brasil surge como o maior produtor mundial de citros, com mais de 1 milhão de hectares de plantas cítricas em seu território.

O Estado de São Paulo destaca-se como o principal produtor do País, sendo responsável por 70% da produção de laranjas e 98% da produção de suco, segundo dados da Associação Brasileira dos Exportadores de Cítricos - ABECitrus (2006).

Na fruticultura, o País ocupa a terceira colocação entre os maiores produtores mundiais, com destaque para a laranja in natura que protagonizou o maior crescimento individual do ano de 2007, com mais de 50 mil toneladas exportadas, o que representou aumento de 64% em volume e 85% em valor, comparados ao ano de 2005, (AgroBrasil, 2006).

A expressividade nos números reflete o domínio que o País mantém no setor ao longo dos anos, não apenas na produção da laranja e seus derivados, mas também na exportação desses produtos, destaque para o suco de laranja concentrado e congelado (SLCC).

Conforme apontado pelo Fundo de Defesa da Citricultura - FUNDECITRUS (2006), e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2006), a receita derivada da exportação de SLCC ultrapassa o montante de US$ 1 bilhão/ano, enquanto a cadeia produtiva do setor movimenta recursos da ordem de US$ 4 bilhões/ano.

Além da sua eficiência e capacidade de produção, a citricultura paulista apresenta algumas características peculiares: a) Os pomares ocupam uma área de aproximadamente 615.300 ha (FUNDECITRUS, 2008), sem grandes variações de relevo ou barreiras físicas e com extensas malhas rodoviárias, cujo trânsito de mudas, sementes, borbulhas e frutos cítricos é intenso, o que confere continuidade espacial entre os pomares. b) As plantas cítricas são perenes e, portanto, estão expostas durante todo o ano e por vários anos ao ataque de pragas e doenças, sem um período de ausência de hospedeiro. c) Os pomares apresentam uma variabilidade genética muito baixa. As laranjeiras doces ((L.) Osbeck) ‘Pêra-Rio’, ‘Natal’, ‘Valência’ e ‘Hamlin’, propagadas vegetativamente, representam 92% da citricultura e o porta-enxerto utilizado em aproximadamente 85% das árvores é o limoeiro ‘Cravo’ (Osbeck), devido a sua rusticidade, vigor conferido à copa e, principalmente, resistência às condições de deficiência hídrica do norte e noroeste do Estado. Estas características conduzem a uma alta vulnerabilidade da cultura à ocorrência de epidemias de doenças conhecidas e de novas doenças com importantes conseqüências para a sustentabilidade deste agronegócio.

Estes e outros indicadores ilustram a importância desta atividade para a economia nacional e a necessidade da criação de mecanismos para que a mesma se desenvolva de forma adequada.

A ABECitrus destaca desafios para a produção paulista de citros que abrange desde a competição por terras devido à expansão da cana-de-açúcar, até o combate às pragas e doenças, como o Cancro Cítrico, a Morte Súbita dos Citros (MSC), o Greening e o CVC (Clorose Variegada dos Citros), sendo essas quatro pragas responsáveis pela redução estimada de 10% da produção média de São Paulo nos últimos anos, o que equivale a 30 milhões de caixas (ABECitrus, 2007).

Com efeito, o principal gargalo para a sustentação e desenvolvimento da atividade citrícola remete à questões fitossanitárias.

Doenças como o Cancro Cítrico, a Clorose Variegada dos Citros, a Morte Súbita dos Citros e, mais recentemente, o Greening, têm causado graves perdas ao setor, com destaque à última citada que, sozinha, é responsável pelos maiores prejuízos do setor na atualidade, segundo dados do Fundecitrus (Cara a cara com as doenças, 2007).

Tais problemas envolvem principalmente a erradicação e renovação dos pomares, que representam um custo bastante elevado para o pequeno e médio produtor, que, usualmente, detêm menor disponibilidade de recursos e acesso a crédito.

Desse modo, a decisão de formação ou não de um novo pomar é um procedimento que envolve grande risco, não apenas pelos gastos envolvidos em tal ação (uma vez que pomares médios costumam ter em torno de 20 a 50 mil plantas), mas também pelo tempo de maturação deste investimento, que acaba se convertendo em um importante custo de transação.

Outros problemas também são enfrentados pela citricultura paulista, como o aumento dos custos de produção e as pragas e doenças que surgem e causam a erradicação de pomares.

No entanto, alguns desses fatores são capazes de causar sérios danos à cultura de citros que é um alvo constante dessas moléstias. Essas doenças encontram condições favoráveis ao seu desenvolvimento, como a influência climática, facilidade de disseminação e, em alguns casos, a ausência de agentes inibidores.

Tais problemas fitossanitários interferem diretamente na quantidade e na qualidade das frutas cítricas produzidas. Dependendo da intensidade do ataque sofrido por pragas ou doenças, os danos deixados na planta podem torná-la improdutiva ou levar à sua erradicação.

Sendo assim faz-se importante considerar que a administração na unidade de produção agrícola não se define apenas como o processo de tomar e colocar em prática decisões sobre objetivos e utilização de recursos. Entretanto, também torna-se fundamental diagnosticar e controlar todos os fatos que possam interferir na produção, principalmente a fitossanidade.

As dificuldades encontradas pelos produtores de citros em lidar com o surgimento e manifestação de doenças os têm levado a buscarem o auxílio dos centros de pesquisas especializados em citros.

No entanto, em alguns casos o procedimento para inspecionar propriedades ainda é rudimentar. O tempo gasto neste processo implica em baixa produtividade e aumento dos custos, devido à falta de controle dos operadores nas suas atividades diárias agravado pela deficiência dos mesmos na obtenção de diagnósticos precisos e precoces.

Dentre as novas doenças o Greening ou Huanglongbing (HLB) tem recebido maior preocupação.

A doença Greening, ou Huanglongbing (HLB) foi relatada nos pomares paulistas a partir de 2004. Atualmente, é a doença mais temida entre os produtores de laranja por não possuir qualquer tipo de cura ou tratamento. Ainda, a referida doença apresenta alta capacidade de disseminação e afeta todas as variedades comerciais de laranjeiras e principalmente, não há métodos de diagnóstico precoce da doença (Fundecitrus).

Os sintomas da Greening são basicamente os mesmos, independente de onde ocorre a doença e de qual variação da bactéria. As árvores afetadas têm como sintoma inicial o surgimento de um ramo ou galho, que se destaca pela cor amarela em contraste com a coloração verde das folhas dos ramos não afetados. As folhas amareladas, ou sintomáticas, apresentam coloração amarela pálida, com áreas de cor verde, formando manchas irregulares, chamadas de mosqueadas. Por ser uma doença que atinge o transporte de seiva bruta, o floema, as plantas novas ficam improdutivas e as plantas maduras reduzem sua produção até não produzirem mais.

A forma atual de controle da doença são inspeções visuais para detecção de árvores sintomáticas e aplicação maciça de inseticidas para controle do vetor. Logo que identificadas, as árvores sintomáticas são arrancadas visando diminuir a proliferação da doença. Este método, entretanto tem se mostrado bastante ineficiente. O Fundecitrus estima que as inspeções visuais tenham falhas que levam a um erro aproximado de 30 a 60%, ou seja, em torno da metade de pés sintomáticos são mantidos no campo por falhas na inspeção.

Até 2008 já foram erradicadas 3 milhões de árvores sintomáticas, implicando na perda de 5,5 milhões de caixas de laranja ao ano, o que corresponde aproximadamente a uma perda anual de 50 milhões de Reais para os produtores. Este esforço de erradicação na fase sintomática não tem resolvido o problema, pois a doença tem mostrado um crescimento exponencial no tempo nas áreas contaminadas.

Em geral, quando os primeiros sintomas são detectados visualmente, a árvore de Citros já se encontrava contaminada há meses. O período estimado de incubação da doença é de aproximadamente 6 a 36 meses. Durante este período que a planta doente assintomática, ou ainda, com sintomas pouco expressivos, permanece no pomar, se torna um propagador invisível da doença. Avaliações do Fundecitrus estimam que no campo para cada árvore sintomática existam mais duas em fase assintomática.

Este fato, aliado ao vetor ser um inseto alado, tem como conseqüência a alta taxa de propagação da doença. O controle do vetor com pulverizações aéreas, ou mesmo com inseticidas sistêmicos, retarda um pouco a velocidade de propagação, mas está longe de resolver o problema. Além disso, as pulverizações aéreas levam a sérios problemas ambientais, como a geração de insetos resistentes aos agroquímicos utilizados e a diminuição da população de insetos, como abelhas, essenciais para polinização de várias plantas. Portanto, a forma atual de controle da doença, além de ineficiente, faz da citricultura um sistema de produção não sustentável.

A Embrapa Instrumentação acaba de aprovar um projeto em vigilância e sanidade vegetal que poderá contribuir significativamente para a elaboração de diretrizes de ação governamental para a sanidade vegetal de acordo com a política de defesa sanitária vegetal definida pelo MAPA. O projeto denominado “GeoTecnologias para Inspeção, Gerenciamento e Análise da Propagação de Greening dos Citros”, têm por objetivo fornecer ferramentas aos citricultores para inspeções mais eficientes, monitoramento da disseminação desta e de outras doenças dos citros para regiões citrícolas do Estado de São Paulo. Ferramentas georeferencidas e de agricultura de precisão a serem aplicadas devem auxiliar i) na identificação dos fatores da disseminação e manifestação da doença, como condições climáticas, proximidade de rodovias, matas e rios, transmissão e flutuação populacional dos possíveis vetores, ii) no desenvolvimento de técnicas rápidas, acuradas e precoces para a estimativa da incidência da doença em pomares e iii) na avaliação, modelagem e mapeamento espacial da doença.

Neste projeto propõe-se desenvolver e disponibilizar a tecnologia para gerar mapas de infestação da doença ainda na fase assintomática, e de vários parâmetros tentando fazer uma análise geoestatística para fazer previsões do comportamento da doença. Baseado no zoneamento de áreas de risco da ocorrência da Greening no Estado e demais informações geradas, todo setor citrícola (viveiristas, citricultores e indústrias de suco) poderá tomar suas decisões com respeito às estratégias de controle ou contenção do avanço da doença e ao planejamento de novos plantios ou projetos ligados à citricultura em regiões menos favoráveis à ocorrência e manifestação da Greening.

Os delineamentos de áreas de estudo estão sendo feitos com base em imagens aéreas Hiperespectrais. Estas imagens permitem um detalhamento muito maior dos espectros emitidos do visível até 2500nm, faixa ideal para diversos estudos. Estes sensores serão os grandes diferenciais na metodologia proposta.

A abordagem utilizada será de combinar os padrões temporais e espaciais da HLB e de potenciais fatores em diferentes escalas no campo (talhões e municípios) utilizando a técnicas modernas e avançadas, num esforço para viabilizar diagnóstico precoce de Greening (HLB) que elimine a subjetividade das inspeções visuais, diminua a taxa de falhas nas inspeções, e permita um diagnóstico mais preciso da doença com pelo menos seis meses de antecedência da fase sintomática.

Espera-se que com esta tecnologia a Embrapa traga uma contribuição significativa para o controle do Greening no Estado de São Paulo.

Lúcio André de Castro Jorge é pesquisador Embrapa Instrumentação Agropecuária

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