Surto de lagartas-pretas em lavouras de soja no Rio Grande do Sul

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

A safra atual de soja tem apresentado inúmeros problemas na região Central do Rio Grande do Sul, devido, principalmente, aos fatores meteorológicos, com temperaturas elevadas e muita chuva. Esta situação climática tem dificultado os tratos culturais usuais na cultura e permitido o surgimento de situações de ataques de pragas com elevadas infestações e desconhecidas da maioria dos produtores.

A partir de dezembro de 2009, consultas sobre a incidência de “lagartas pretas” desfolhando soja nova (desde unifoliadas até V5) foram freqüentes. A queixa mais comum consistiu, durante a avaliação de infestação, na constatação de duas ou três lagartas pretas e plantas totalmente desfolhadas em menos de dois ou três dias. Os tratamentos com os inseticidas indicados para o controle da lagarta da soja, nas suas respectivas doses, não apresentavam eficácia aceitável e a aplicação tinha de ser refeita entre três e quatro dias depois.

A maioria dos sojicultores não trazia material para análise e por isso houve inicialmente dificuldade de se saber o que estava acontecendo realmente. A partir do final de dezembro e em janeiro, nas consultas telefônicas se solicitava material para identificação, pois cada produtor descrevia as lagartas encontradas de formas diferentes.

Visitas feitas a lavouras (em diferentes estágios de desenvolvimento) e o material trazido por produtores e profissionais da Assistência Técnica, permitiram constatar mais de dez espécies de lagartas de colorações escuras, sendo que a maioria delas pode eventualmente danificar a soja, (mas que normalmente se alimentam de outras plantas, especialmente ervas daninhas que ocorrem na cultura da soja).

A maioria destas espécies são lagartas de hábitos noturnos, passando o dia escondidas sob a palhada, torrões ou embaixo das ervas daninhas dessecadas. Em algumas lavouras, onde o produtor alegou não achar lagartas e as plantas apresentavam alto desfolhamento (mais de 50%), a aplicação de glifosato havia sido realizada entre três e quatro dias antes da avaliação. Ao ser examinado o material dessecado se encontrou pelo menos três espécies de Spodoptera,( a mais comum foi a lagarta do cartucho do milho, Spodoptera frugiperda, mas também ocorreram a lagarta da batata doce, Spodoptera eridania e a lagarta “marrom”, Spodoptera cosmioides), as duas espécies de lagartas do trigo, Pseudaletia sequax e P. adultera, pelo menos duas espécies de lagarta rosca, Agrotis ipsilon e Peridroma saucia, outras espécies de Noctuidae, como a lagarta da erva de bicho, Trachaea anguliplaga, a lagarta do pé de gato, Perigea sutor, e a lagarta verde dos capins, Dargida meridionalis; além de algumas lagartas peludas de cor marrom escura e mesmo completamente pretas (da subfamília Arctiinae) com alguma atividade urticante, com ocorrência em baixadas e em lavouras de várzeas.

Houve infestações superiores a 50 lagartas grandes, (>2cm), por metro quadrado de terreno o que explica os grandes desfolhamentos em pequeno espaço de tempo, conforme as queixas recebidas de técnicos e de produtores.

A ocorrência destas elevadas densidades de lagartas possivelmente se explique pela decorrência do inverno passado que foi mais rigoroso em relação a anos anteriores, associada às elevadas precipitações que tem causado inúmeros problemas aos produtores. As baixas temperaturas (inferiores a 10ºC por vários dias) afetaram a população dos inimigos naturais, o que permitiu que a maioria das lagartas de pastos nativos, na Primavera completassem seu ciclo, o que teve como resultado a explosão populacional destas espécies na entrada do Verão.

Avaliações de infestação de lagartas em pastos nativos, nos meses de outubro e novembro, permitiram a constatação de uma população elevada destas lagartas. Exemplares trazidos do campo para completar seu desenvolvimento em laboratório apresentaram incidência de parasitismo inferior a 1%, indicando efeito negativo do frio do Inverno de 2009 sobre estes agentes de controle biológico. Em anos de Inverno ameno, o nível de parasitismo destas lagartas tem variado entre 30% e 60% no material amostrado.

Estas lagartas, que se abrigam ao nível do solo ou ficam levemente enterradas durante o dia, não são amostradas pelo pano de coleta e raramente são constatadas pelo exame das plantas, sistema habitualmente adotado pela maioria dos sojicultores. Quase todas estas espécies, devido ao seu comportamento, necessitam quantidades maiores dos inseticidas indicados para o controle das lagartas que atacam a soja, Anticarsia gemmatalis ou Pseudoplusia includens. Isto explica, em parte, a queixa da ineficácia do controle químico.

Como controlar

A utilização de inseticidas fisiológicos pode até controlar estas infestações, mas como a ação letal é um pouco mais demorada (cerca de três dias a cinco dias) o desfolhamento será elevado ou mesmo total.

Recomenda-se a associação de um produto com ação de choque (geralmente um piretróide ou um organofosforado) na dose cheia com um fisiológico, também com dose cheia. Nas avaliações, onde for constatado mais de 20 lagartas grandes por metro quadrado, além de aumentar a dose do produto de choque, utilizar no mínimo, 150 litros de calda/ha para molhar a palhada e atingir as lagartas nos seus abrigos.

Até o momento, não se dispõe de informações sobre a eficácia de aplicação aérea, pois todos os valores reunidos foram de aplicações terrestres. O aumento de doses tem como justificativa as elevadas densidades de lagartas e as quantidade de chuvas que tem caído (que facilmente retiram o inseticida das plantas, diminuindo o efeito residual dos produtos aplicados). A adição de um espalhante adesivo é fundamental nestes casos.

Ciclo

O ciclo da maioria destas lagartas que, no momento, estão atacando as lavouras de soja, nesta fase vegetativa, varia de 18 dias a 25 dias, sendo a fase de ovo de 2 dias a 3 dias, lagartas de 10 dias a 14 dias e de pupa entre 6 dias e 8 dias, nas condições meteorológicas que estão ocorrendo (elevadas temperaturas e chuvas em quantidade). A cultura da soja é favorecida por estas condições climáticas. Por outro lado, as pragas também são beneficiadas, fazendo com que o produtor tenha que monitorar com maior precisão e gastar mais para o controle destes agentes nocivos.

Para adequar custos, o monitoramento é fundamental na avaliação da infestação. Nestas situações recomenda-se o exame direto do solo sob as plantas de soja. É um processo trabalhoso e lento, mas é a única maneira para se poder adequar a dose de inseticida para controlar com eficiência as pragas que estão atacando a lavoura.

Universidade Federal de Santa Maria

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