Sempre em forma

Maçã resiste por bastante tempo, desde que seja armazenada da forma correta.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

A maçã é um organismo vivo e sua vida pós-colheita é limitada por processos bioquímicos, os quais desencadeiam o amadurecimento do fruto, culminando na sua senescência (morte do fruto). Deste modo, para aumentar o período de conservação, há necessidade de reduzir a velocidade da deterioração através do manuseio adequado das condições de armazenamento. Considerando o contínuo aumento da produção e a necessidade de suprir a demanda de maçãs durante os 12 meses do ano, bem como a exigência por frutos de qualidade por parte do consumidor, os produtores brasileiros têm feito significativos investimentos para ampliação e aperfeiçoamento do seu sistema de armazenagem. Segundo a Associação Brasileira de Produtores de Maçãs (ABPM), a produção nacional atingiu mais de 950 mil toneladas de maçãs no ano agrícola 1999/2000, sendo que mais de 287 mil toneladas foram armazenadas em atmosfera controlada e aproximadamente 224,5 mil toneladas foram armazenadas em frio.

No sentido de contribuir com o avanço da tecnologia pós-colheita em maçãs, o Núcleo de Pesquisa em Pós-Colheita (NPP), da Universidade Federal de Santa Maria, desde sua fundação em 1993, vem realizando trabalhos de pesquisa no armazenamento das cultivares de maçã de maior expressão no Brasil. Com apoio da FAPERGS, CNPq e empresas de maçãs já foram conduzidos mais de uma centena de trabalhos, os quais proporcionaram grandes avanços no armazenamento comercial de maçãs, colocando a tecnologia brasileira no patamar daquela dos países desenvolvidos. O objetivo deste artigo é relatar, resumidamente, algumas informações geradas no NPP para o armazenamento desta fruta.

FATORES QUE AFETAM A CONSERVAÇÃO

O potencial de armazenamento da maçã, em geral, é considerado excelente se comparado ao de outras espécies frutíferas. Entretanto, vários são os fatores que interferem neste potencial, dos quais podemos citar como mais importantes a cultivar a ser armazenada, as condições climáticas durante o desenvolvimento dos frutos, o estádio de maturação do fruto no momento da colheita e a condição nutricional da planta, além do manejo pós-colheita e as condições de armazenamento.

Em alguns casos, as condições ideais de armazenamento podem variar, para a mesma cultivar, em função destes fatores. Por exemplo, a maçã cultivar Fuji, em geral, não tolera concentração de CO2 maior que 1,0%, porém temos observado que, em alguns anos, ela suporta até 2% de CO2. Possivelmente, esta variação esteja relacionada às condições climáticas durante o desenvolvimento do fruto, que interferem na difusão do CO2 através das células do fruto, modificando a suscetibilidade desta cultivar ao dióxido de carbono. Este comportamento também foi observado em maçã ‘Braeburn’ na Europa. Entretanto, com a falta de uma metodologia eficiente para predizer esta maior ou menor suscetibilidade ao CO2, é prudente armazenar a cultivar Fuji em atmosfera com concentração <1% de CO2.

MÉTODOS DE ARMAZENAMENTO

No Brasil, os métodos predominantes na conservação de maçãs são o armazenamento refrigerado, também chamado de frigoconservação, e o armazenamento em atmosfera controlada. Segundo a ABPM, 56% do volume de maçãs armazenado é em atmosfera controlada e o restante (44%) em armazenamento refrigerado. Dependendo da cultivar, técnicas complementares são utilizadas, tais como pré-resfriamento dos frutos após a colheita, rápida instalação da atmosfera, remoção do etileno, entre outros, cuja finalidade é melhorar ainda mais a conservação das qualidades físico-químicas do produto.

Existe uma grande variação de resposta entre as cultivares de maçãs às formas de armazenamento, sendo que cada cultivar apresenta temperatura, condição de AC e umidade relativa adequada para o seu armazenamento. É importante frisar que o uso de condições inadequadas de armazenamento pode causar grandes perdas à maçã armazenada. A seguir descreveremos as formas de armazenamento com suas vantagens e desvantagens, condições ideais de armazenamento para cada cultivar, bem como o tempo máximo de armazenamento.

Armazenamento Refrigerado

O armazenamento refrigerado (AR) consiste apenas na redução da temperatura e controle da umidade relativa. A grande vantagem deste método é ser mais econômico. A temperatura é o principal fator responsável pela redução dos processos metabólicos nos frutos. A velocidade com que ocorrem os processos metabólicos na fase pós-colheita depende principalmente da temperatura. A diminuição da temperatura em 10ºC reduz o metabolismo dos frutos em 2 a 3 vezes.

Apesar da temperatura ser o principal fator na manutenção da qualidade pós-colheita dos frutos e apresentar um custo relativamente mais baixo que o armazenamento em AC, a frigoconservação, isoladamente, não reduz suficientemente o metabolismo para permitir um longo período de armazenamento. Na tabela 1 (

), pode-se observar as condições aconselhadas para a conservação de maçãs em AR e o tempo máximo de armazenamento.

Atmosfera Controlada

O armazenamento em atmosfera controlada (AC) baseia-se no princípio da modificação da concentração de gases na atmosfera natural, ou seja, a concentração de CO2 é aumentada e a de O2 é reduzida. O armazenamento em AC foi usado comercialmente pela primeira vez na Inglaterra, em 1929. No Brasil, a primeira câmara de atmosfera controlada foi instalada somente em 1982, em Fraiburgo – SC, para o armazenamento de maçãs.

O uso de AC, no armazenamento de maçãs, permite um aumento de 50 a 80% no período de armazenamento dos frutos. Na tabela 2, podem ser observadas as condições de AC adequadas para o armazenamento das principais cultivares de maçã produzidas no Brasil, segundo os estudos da UFSM.

Na definição de uma condição de AC, é conveniente que sempre seja consultado um Engenheiro Agrônomo experiente, pois a temperatura, as concentrações de O2 e CO2 e o ponto de maturação interagem, podendo ocorrer dano pelo frio em determinadas combinações de gases ou ponto de maturação da fruta.

A grande vantagem do armazenamento em atmosfera controlada é o aumento no período de conservação de maçãs, mas também reduz a incidência de podridões, distúrbios fisiológicos, perda de peso e murchamento dos frutos, aumento da vida de prateleira dos frutos e permite a colheita em um estádio mais avançado de maturação. Como desvantagens do armazenamento em atmosfera controlada, pode-se destacar o maior custo de investimento na instalação da câmara, possibilidade de ocorrência de distúrbios fisiológicos, conseqüentes de danos pelo baixo O2 e alto CO2, dificuldade no armazenamento de diferentes cultivares de maçãs numa mesma câmara, em função de diferentes exigências da composição da atmosfera, e maior necessidade de mão-de-obra qualificada para o acompanhamento diário das câmaras.

TÉCNICAS COMPLEMENTARES

Mesmo com o uso da atmosfera controlada, em armazenamento muito prolongado, pode ocorrer acentuada perda de qualidade do produto. Com a finalidade de minimizar estas perdas, existem algumas técnicas que podem ser utilizadas, como o pré-resfriamento dos frutos, a rápida instalação da atmosfera e a remoção do etileno da câmara.

O pré-resfriamento pode ser realizado em ar forçado ou em água, sendo que esta última forma pode acarretar enormes prejuízos por podridões, que são difundidas na água de resfriamento, tanto na maçã ‘Fuji’ como na ‘Gala’, segundo os trabalhos do NPP da UFSM.

A remoção do etileno no armazenamento da cultivar Gala pode aumentar o período de armazenamento em 1 a 1,5 mês em relação ao conseguido somente com o uso de AC. Entretanto, para esta técnica ser realmente eficiente, deve-se usar um equipamento eficaz na remoção do etileno, mantendo os níveis deste gás, no interior da câmara, inferiores a 0,4ppm, sendo que a maçã não deve ser colhida muito madura. Nos últimos anos, o NPP iniciou o estudo de produtos químicos que atuam na síntese e ação do etileno, como o caso do AVG (inibidor da síntese de etileno) e o 1-MCP (inibidor da ação do etileno). Ambos produtos têm mostrado muito boa eficiência na conservação da maçã ‘Gala’, no entanto, na maçã ‘Fuji’ os resultados são menos promissores. Estes produtos ainda não estão registrados para o uso comercial, fato que, provavelmente, acontecerá em breve.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As condições ideais para conservação de maçãs são específicas para cada cultivar, bem como o potencial de armazenamento. Entretanto, todas as cultivares demonstram melhor qualidade quando armazenadas sob atmosfera controlada. Para conseguir uma ótima conservação dos frutos, é indispensável que estes sejam colhidos no ponto ideal de maturação para o armazenamento. Outros estudos serão realizados, gerando novas tecnologias e aprimorando as já existentes, melhorando ainda mais a tecnologia pós-colheita disponível para a conservação da maçã brasileira.

Auri Brackmann e Cristiano André Steffens

UFSM

* Confira este artigo, com fotos e tabelas, em formato PDF. Basta clicar no link abaixo:

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