Plantas hospedeiras de Helicoverpa armigera

Presente em todos os estados brasileiros, estudos sobre aspectos biológicos do desenvolvimento deste inseto em diferentes cultivos, como soja, algodão, milho e trigo é de fundamental importância para o sucesso no manejo

13.06.2022 | 15:50 (UTC -3)

Praga agressiva e polífaga, capaz de se alimentar em diferentes plantas hospedeiras, Helicoverpa armigera é responsável por prejuízos anuais em torno de 5 bilhões de dólares. Presente em todos os estados brasileiros, estudos sobre aspectos biológicos do desenvolvimento deste inseto em diferentes cultivos, como soja, algodão, milho e trigo é de fundamental importância para o sucesso no manejo.

Helicoverpa armigera (Hübner) (Lepidoptera: Noctuidae) é uma das principais pragas agrícolas do mundo, por ser considerada uma espécie polífaga, isto é, se alimenta de diferentes plantas hospedeiras, que se adapta facilmente a diferentes tipos de ambientes, possuir grande capacidade de dispersão, auto índice de reprodução e elevado poder de causar danos nos cultivos.

Em função disso, sua presença tem sido registrada em várias regiões do mundo, como na África, Europa, Ásia e Oceania. Em 2013, lagartas de H. armigera foram constatadas alimentando-se de diferentes culturas e plantas daninhas em alguns estados brasileiros, causando redução de até 80% na produção de algodão e perdas expressivas em soja e milho, o que exigiu maior aplicação de inseticidas para o seu controle, elevando-se assim o custo de produção dessas culturas. Os prejuízos causados por esta praga chegam anualmente a 5 bilhões de dólares. Sua presença já foi constatada em mais de 170 gêneros de plantas, incluindo culturas como algodão, soja, milho e trigo. As lagartas desta espécie, embora ingiram folhas nos primeiros instares larvais, possuem preferência para se alimentar das estruturas reprodutivas dos hospedeiros, como botões florais, frutos, maçãs, espigas, panículas e inflorescências.

Estima-se que H. armigera esteja atualmente presente em praticamente todos os estados brasileiros. Em razão da sua incidência no Brasil e do alto risco de perdas causadas pelo seu ataque, é importante conhecer bem a praga, saber como realizar a sua identificação correta bem como implementar algumas técnicas de manejo, afim de obter boa produtividade nos cultivos. As diferentes plantas nas quais esta espécie se hospeda influenciam na sua sobrevivência, a duração, o número de instares, a intensidade do consumo larval, bem como a fecundidade e longevidade dos adultos. Assim, estudos sobre aspectos biológicos quando H. armigera se desenvolve em diferentes hospedeiros é de fundamental importância para o sucesso de seu manejo.

É possível calcular a capacidade de crescimento da população de H. armigera quando criada em diferentes culturas. Isso é essencial para compreender sua taxa de mortalidade, de sobrevivência, o tempo de desenvolvimento e sua capacidade reprodutiva. Esses dados ecológicos são fundamentais para avaliar a adequação de diferentes plantas hospedeiras com relação ao desenvolvimento da praga.

Criação de H. armigera em diferentes hospedeiros

Trabalhos conduzidos na Embrapa Agropecuária Oeste evidenciaram que a criação de H. armigera em dieta artificial, assim como em diferentes plantas hospedeiras apresentou resultados diferentes quanto a duração e sobrevivência deste inseto-praga (Tabela 1). Possivelmente, as melhores características nutricionais da dieta artificial foram determinantes para que houvesse essa melhoria no desenvolvimento e na viabilidade das larvas, indicando que este alimento é adequado para a alimentação das larvas de H. armigera, em comparação às plantas hospedeiras testadas. Esses resultados ratificam o sucesso da criação de H. armigera em condições de laboratório utilizando a dieta artificial. Por outro lado, embora os insetos tenham completado o ciclo de vida nas culturas do milho e do trigo, as avaliações da duração e a viabilidade larval indicaram que estes hospedeiros são menos adequados para o desenvolvimento de H. armigera, em comparação à soja e ao algodão.

Tabela 1
Tabela 1

As lagartas de H. armigera pouco se alimentavam das folhas de milho e trigo, o que não ocorreu para as partes reprodutivas destes hospedeiros (grãos de milho e panículas de trigo). Provavelmente as características físicas e químicas presentes nas folhas do milho e do trigo foram responsáveis pela longevidade larval superior e menor viabilidade larval em comparação à dieta artificial (Tabela 2). As larvas de H. armigera quando alimentadas apenas com folhas de milho podem também não completar esta fase de desenvolvimento.

A duração do período larval é um parâmetro importante, pois indica se o alimento utilizado é adequado ou não para a alimentação das larvas. Além disso, os maiores índices de mortalidade larval em milho e trigo podem ser justificados pela dureza das folhas e/ou alto conteúdo de hemicelulose, que estão normalmente presentes nas folhas destes hospedeiros, em especial do milho.

Tabela 2
Tabela 2

Constatou-se uma inadequação dos hospedeiros milho e trigo para a alimentação de lagartas de H. armigera, refletindo na fase de pupa, que apresentaram maior mortalidade pupal. O peso de pupas também é um parâmetro importante, pois pode indicar se um hospedeiro é adequado para o desenvolvimento bem como para a fecundidade do inseto. Houve diferença quanto à fecundidade quando o inseto foi criado com os diferentes tipos de alimento (Tabela 3). A maior fecundidade diária das fêmeas de H. armigera registrada no algodão indica que este hospedeiro é adequado para o desenvolvimento desta praga. O mesmo também foi observado para a fecundidade total, quando os adultos criados em algodão ovipositaram 64% e 95% a mais, respectivamente, em comparação ao milho e trigo. A capacidade de conversão do alimento assimilado na fase larval e as características do próprio inseto podem gerar consequências na fecundidade dos adultos de H. armigera.

Tabela 3
Tabela 3

A taxa líquida de reprodução (Ro), isto é, o número médio de fêmeas gerado por fêmea ao longo do período de oviposição foi superior em algodão, uma vez que apresentaram um número de descendentes produzidos/fêmea e taxa de sobrevivência dos adultos fêmeas elevadas (Tabela 4). Os menores valores de Ro e rm (velocidade de crescimento da população) são registrados para o milho e o trigo, que tiveram também baixa fecundidade e mortalidade mais alta no período reprodutivo. Isso enfatiza a baixa adequação destes hospedeiros para o desenvolvimento de H. armigera.

Tabela 4
Tabela 4

O número de indivíduos adicionados à população/fêmea/dia indicam ser o algodão e a soja os hospedeiros também mais adequados para o desenvolvimento da praga. O tempo que a população de H. armigera leva para duplicar em número (TD) foi maior em trigo e milho devido à baixa fecundidade e alta mortalidade de adultos ao final do período reprodutivo. Esse tempo de duplicação foi menor no algodão e na dieta artificial, sugerindo que o inseto, quando criado nestes alimentos, tende a aumentar em número mais rapidamente.

A proporção de macho:fêmea de H. armigera nos hospedeiros avaliados foi de 1:1, portanto, com uma razão sexual de 0.5. Para o ritmo de emergência de adultos macho e fêmea de H. armigera, a maioria dos insetos emergiu no máximo até aos onze dias do desenvolvimento pupal (Figura 1). Mais de 80% das posturas foram realizadas nas duas primeiras semanas de oviposição para todos os hospedeiros avaliados. O pico de oviposição das mariposas criadas em milho e trigo ocorreu nas duas primeiras semanas e decresceu progressivamente após esse período (Figura 2). Em soja e algodão a postura também se concentrou nas primeiras duas semanas, mas teve um padrão mais uniforme e estável ao longo do período de oviposição.

Figura 1. Ritmo de emergência (dias) de machos e fêmeas de H. armigera quando criada em diferentes hospedeiros. Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados, MS. 2015. 
Figura 1. Ritmo de emergência (dias) de machos e fêmeas de H. armigera quando criada em diferentes hospedeiros. Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados, MS. 2015. 
Figura 2. Ritmo de postura de H. armigera quando criada em diferentes hospedeiros. Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados, MS. 2015. 
Figura 2. Ritmo de postura de H. armigera quando criada em diferentes hospedeiros. Embrapa Agropecuária Oeste, Dourados, MS. 2015. 

Considerações Finais

Com base nos resultados obtidos nesta pesquisa, pode-se inferir que o manejo de H. armigera na cultura do milho e trigo, principalmente em relação à aplicação de defensivos agrícolas, deve levar em consideração que nestas culturas poderá haver uma população inicial reduzida dessa praga no campo, em comparação à soja e algodão, uma vez que estes hospedeiros apresentaram alta mortalidade larval e pupal e um baixo potencial biótico. Ao considerar que as mariposas ovipositaram por um período mais longo em algodão e soja, isso pode aumentar o potencial de dano causado pelas lagartas nesses cultivos.

Figura 3. Lagartas de Helicoverpa armigera criadas em soja (A,B,C), algodão (D), milho (E) e danos em folhas de soja (F)
Figura 3. Lagartas de Helicoverpa armigera criadas em soja (A,B,C), algodão (D), milho (E) e danos em folhas de soja (F)

Os hospedeiros algodão e soja apresentaram maior viabilidade nas fases de desenvolvimento, maior taxa de sobrevivência de adultos fêmea no período reprodutivo e fecundidade superior aos demais hospedeiros testados e semelhantes para os insetos criados em dieta artificial, evidenciando que estes dois hospedeiros podem ser adequados para a criação de H. armigera como dieta natural.

Figura 4. Adultos de Helicoverpa armigera. Macho (A) e Fêmea (B)
Figura 4. Adultos de Helicoverpa armigera. Macho (A) e Fêmea (B)

Os parâmetros da tabela de vida de fertilidade indicam ser o milho e o trigo os hospedeiros menos adequados para o desenvolvimento da população de H. armigera, uma vez que apresentaram valores inferiores de Ro (taxa líquida de reprodução), de rm (capacidade de aumentar em número) e de λ (razão finita de aumento) em comparação aos demais hospedeiros.

Artigo publicado na edição 223 da Cultivar Grandes Culturas, mês dezembro 2017/janeiro 2018. 

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