Manejo contra principais pragas que atacam lavouras de arroz irrigado

Identificação de insetos e controle químico racional é o caminho para manejo sustentável das áreas de cultivo

22.06.2020 | 20:59 (UTC -3)

Bicheira da raiz, lagarta da panícula, percevejos do colmo e do grão, pulgão da raiz e broca do colmo estão entre as principais pragas que atacam as lavouras de arroz irrigado. Identificar corretamente estes insetos, determinar o nível de dano econômico e lançar mão do controle químico no momento correto e de modo racional são o caminho para o manejo sustentável das áreas de cultivo.

A incidência de insetos nos últimos períodos tem preocupado os produtores, pois além das altas populações, novas espécies estão atacando a lavoura de arroz irrigado. O produtor deve preocupar-se com as principais pragas, para as quais estratégias podem ser adotadas ao longo do ciclo da cultura, devido os danos econômicos. O conhecimento do histórico de ocorrência das pragas na área é de grande importância para a implantação de métodos de controle. Dessa forma, o produtor deve ficar atento a ocorrência de insetos, logo o monitoramento deve ser adotado para estimar a população.

ASPECTOS IMPORTANTES NO MANEJO DE PRAGAS

Identificação e período de ocorrência

O conhecimento do impacto das pragas na produção do arroz irrigado e as condições que favorecem o aumento são importantes fatores no seu manejo. Primeiro é necessário  conhecer e saber identificar as principais pragas, os danos causados e qual o estádio crítico da planta ao ataque do inseto. Também na lavoura ocorrem espécies de insetos secundários com pouca probabilidade de causarem dano à cultura.

Nível de dano econômico

É a densidade populacional da praga que causa redução no rendimento de grãos, igual ou superior ao custo estimado no controle. A simples presença do inseto na lavoura não deve necessariamente determinar o controle. Isso só deve ocorrer quando a população atingir níveis que podem provocar danos à cultura.

Monitoramento

O monitoramento é a maneira correta de determinar a população existente na lavoura através de amostragens que devem ser realizadas semanalmente. O número de amostras e o tamanho da área de coleta serão determinantes na precisão do método. Portanto, quanto maior o número de amostras maior será a precisão do monitoramento. A determinação da população de insetos pode ser feita através da coleta de no mínimo 30 amostras representativas da área.

Inimigos naturais

Os insetos benéficos são importantes pela sua constante presença e a relativa abundância.  Medidas para preservá-los, como deixar áreas de refúgio junto à lavoura após a colheita, onde podem abrigar-se em condições desfavoráveis nas temperaturas baixas da entressafra, vai garantir a sua sobrevivência. Entre as principais espécies de inimigos naturais destacam-se as aranhas. Nas lavouras de arroz do Rio Grande do Sul a principal espécie é a Alfaida venilae, que correponde a 80% da população. As aranhas não danificam as plantas, possuem a capacidade de aumento rápido da população e no caso de explosões populacionais pode ocorrer o canibalismo. Também as libélulas, tesourinhas e joaninhas, são importantes predadores, ao alimentarem-se de mariposas, ovos, pupas, pequenas lagartas, ácaros e pulgões.

PRINCIPAIS PRAGAS

Bicheira-da-raiz, Oryzophagus oryzae

É a mais importante praga, pois ocorre em todas as regiões e ataca mais de 65% da área semeada do Rio Grande do Sul.  Além da espécie O. oryzae, outras foram encontradas no estado gaúcho, como: Lissorhoptrus bosqi, carinirostris, lepidus e tibialis. Nesta última espécie os adultos são maiores que das demais.   

A hibernação dos insetos ocorre dentro ou fora da lavoura, mas a partir de setembro, com o aumento da temperatura e com a irrigação, os adultos são atraídos para a lavoura estendendo-se até dezembro. Entrando na lavoura, primeiro alimentam-se das folhas deixando cicatrizes brancas longitudinais à nervura principal e a seguir as fêmeas colocam os ovos nos colmos. Após, surgem as larvas, que alimentam-se no interior da bainha foliar e após deslocam-se para as raízes. Estas apresentam 6 pares de austórios, cuja finalidade é retirar o oxigênio das raízes. As larvas apresentam ciclo médio de 4 semanas. Aos 20 dias após a irrigação, as larvas começam o ataque às raízes causando grandes danos. Uma segunda infestação ocorre, geralmente, aos 50 dias após a irrigação, e como as larvas preferem as raízes novas, poderão ocorrer danos.

O monitoramento das larvas é importante e deve ser iniciado aos 20 dias  depois da irrigação,  examinando as raízes. Após, arrancar 15 plantas/amostra, colocá-las em balde com água e, ao serem agitadas, as larvas aparecerão na superfície sendo facilmente contatadas. As amostragens devem ser coletadas em áreas favoráveis à ocorrência de larvas, em lavouras semeadas primeiro ou com lâmina de água mais alta.

Os sintomas característicos são plantas menores e sistema radicular danificado. As raízes parecem pouco destruídas, mas ao remover o solo verifica-se que a parte central é a mais atacada.

As maiores infestações de larvas ocorrem dos 35 dias aos 45 dias após o início da irrigação, causando danos em torno de 10%. As cultivares de ciclo precoce são as mais danificadas. Cada larva/amostra, em médi,a pode causar redução de até 1,5%.

Lagarta-da-panícula, Pseudaletia sequax e P. adultera

É uma das principais pragas, está distribuída por todo o Rio Grande do Sul e tem ocorrido em mais de 45% da lavoura. São duas as espécies: a Pseudaletia adultera e a P. sequax, sendo que a adultera é responsável por mais de 70% da população. As fêmeas fazem as posturas nas folhas e colmos, colocando até 1000 ovos. Após surgem as lagartinhas que atacam as plantas, em média, por 28 dias. Nos primeiros estágios as lagartas se alimentam das folhas e nos demais cortam as panículas. A  diferenciação das lagartas dessas espécies, é viável a partir do quarto ínstar, sendo   as P. adultera são escuras e as P. sequax, rosadas. 

Dano provocado pela lagarta-da-panícula.
Dano provocado pela lagarta-da-panícula.

O período crítico da lagarta-da-panícula vai do florescimento até a colheita. Durante o dia as lagartas encontram-se abrigadas na parte inferior das plantas, subindo a noite para atacarem as panículas.

O monitoramento deve ser realizado na fase crítica. São recomendadas amostragens em que são abertas as plantas para verificar a ocorrência de lagartas ou se existe parte da panícula caída no solo. Quando forem  encontradas 2 lagarta/m², medidas de controle devem ser adotadas, pois quando estes insetos ocorrem em altas populações os prejuízos na produtividade podem chegar a 20%. 

Depois da colheita as lagartas hibernam dentro da lavoura, abrigando-se na resteva, em áreas mais altas. Mesmo com temperaturas baixas no mês de junho, na palha do arroz foram encontradas lagartas. 

Percevejo-do-colmo, Tibraca limbativentris

Este inseto é uma das principais pragas, tem atacado mais de 40% da lavoura e ocorre em todas as regiões gaúchas.  Devido a sua ocorrência anual, altas populações nas últimas safras, e por estar distribuído por toda a área, tem preocupado os produtores. 

Adulto do percevejo-do-colmo, inseto que tem atacado mais de 40% da lavoura.
Adulto do percevejo-do-colmo, inseto que tem atacado mais de 40% da lavoura.

A partir de setembro, com o aumento da temperatura e o fotoperíodo, os adultos abandonam os locais de hibernação e se dirigem à lavoura. No início a população de adultos é baixa, porém com a postura de até 500 ovos por fêmea, vai ocorrer grande aumento populacional.

Os danos dos percevejos ocorrem em dois estágios da planta: no afilhamento atacam o colmo, onde se observa um ponto de coloração escura, devido ao estrangulamento do colmo, provocando a morte da folha central, sintoma denominado de "coração morto". Na fase reprodutiva, provoca a formação de panículas brancas ou com grande número de grãos estéreis. Cada percevejo/m² pode causar perdas de 2% no rendimento de grãos.

O monitoramento deve ser realizado semanalmente desde o início do perfilhamento até o florescimento. Como o percevejo tem o hábito de permanecer na parte inferior das plantas, geralmente a infestação não é observada. Então a amostragem deve ser feita, preferencialmente nas taipas, abrindo-se as plantas para localizar os insetos. Em muitas lavouras não monitoradas o ataque do percevejo foi observado tardiamente, quando da incidência de panículas brancas ou na colheita ao examinar o graneleiro e na pré-limpeza, pela alta incidência de insetos.

Com a colheita do arroz, os percevejos hibernam a partir do final de abril em áreas dentro ou próximas à lavoura não sujeitas à inundação, abrigando-se em restos culturais, nas plantas daninhas, sendo o principal hospedeiro o rabo-de-burro, Andropogon bicornis. Na cana-de-açucar foram encontrados até 10 percevejos/planta abrigados entre a lígula e o colmo. Na hibernação em várias lavouras do Rio Grande do Sul, foram coletados insetos atacados por fungos, destacando-se o Beauveria bassiana.

Hibernação de percevejo-do-colmo, cujo período se estende até setembro.
Hibernação de percevejo-do-colmo, cujo período se estende até setembro.

Percevejo-do-grão (Oebalus poecilus e O. ypsilongriseus)

O percevejo-do-grão é uma espécie de ocorrência crônica e está distribuído em todo o estado gaúcho. Os insetos adultos, após deixarem os locais de hibernação, podem ser encontrados nos campos, pastagens ou nas plantas daninhas próximas à lavoura, procurando sementes para a alimentação. Os principais hospedeiros são: Echinochloa spp, Paspalum spp, Brachiaria spp e Digitaria spp. Posteriormente, as fêmeas dirigem-se para a lavoura, colocando os ovos nas folhas, grãos do arroz ou plantas daninhas, podendo envolvê-las completamente e, após 7 dias, surgem as ninfas. Mesmo ocorrendo em focos, os insetos deslocam-se e realizam as posturas em várias partes da lavoura.

Em dias com temperaturas altas, muita luminosidade e com vento, os insetos ficam abrigados na parte central das plantas. As amostragens devem ser realizadas no final da tarde, quando os percevejos são encontrados nas partes superiores das plantas. O monitoramento deve ser realizado no florescimento, evitando perdas.    

Os danos são causados por ninfas e adultos sendo que no estágio leitoso ocorre a formação de panículas estéreis. No estágio final, os grãos ficam enfraquecidos e quebram ao serem beneficiados. Além dos danos diretos, as picadas dos insetos podem transmitir fungos causadores de manchas nos grãos.  A cada inseto /m² ocorre redução de 1% no rendimento de grãos.

Pulgão-da-raiz, Rhopalosiphum rufiabdominale

Este inseto é um dos principais da região da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, ocorrendo também na Depressão Central e Planície Costeira Externa.

Na forma adulta, apresenta abdômen de coloração verde escura com área vermelho-alaranjada.  A espécie caracteriza-se por apresentar antenas com 5 artículos. As fêmeas são aladas ou ápteras, com predominância da última.  Os pulgões hibernam nas plantas daninhas, destacando-se a roseta, mas também são encontrados no azevém, rabo-de-burro e capim-arroz.  Como atacam a lavoura antes da irrigação, formando colônias nas raízes, o monitoramento deve ser adotado neste estágio.

Presença de pulgões em ataque às raízes.
Presença de pulgões em ataque às raízes.

Os pulgões, por apresentarem coloração escura, são difíceis de serem observados, pois se confundem com a coloração do solo. As amostragens devem ser feitas arrancando-se as plantas, e com um exame nas raízes pode ser constatado o inseto. Também, ao colocar um papel de coloração clara e agitando-se a planta, o inseto cairá junto com o solo e logo em seguida os pulgões começam a movimentar-se, facilitando a sua identificação.  

Os danos causados pelos pulgões nas raízes são observados nas plantas com clorose nas pontas das folhas, enrrugadas, de coloração vermelho-alaranjadas, posteriormente plantas secas. As maiores infestações ocorrem nas taipas, reduzindo o estande inicial e após, a morte das plantas.

Danos do pulgão-da-raiz em lavoura de arroz irrigado.
Danos do pulgão-da-raiz em lavoura de arroz irrigado.

Broca-do-colmo, Diatraea saccharalis

A broca-do-colmo tem aumentado sua população e ocorre todos os anos atacando as lavouras da região da Fronteira Oeste. Os adultos têm hábito noturno e se caracterizam por apresentar asas anteriores de coloração amarelada, com duas estrias transversais no terço apical. As fêmeas realizam as posturas agrupadas, na parte superior das folhas; após surgem as lagartas que perfuram o colmo das plantas e alojam-se no seu interior.  Passam por 6 estágios e tem um ciclo médio de 30 dias.

O monitoramento da broca-do-colmo é feito pela identificação dos sintomas e pelo orifício nos colmos. As taipas são os locais da lavoura com maior infestação de broca-do-colmo.

Os danos na fase vegetativa ocorrem aos 30 dias após a irrigação e são causados pela morte da folha central. Na fase reprodutiva ocorre a formação de panículas brancas. As lagartas também atacam os grãos em formação..  

Os danos provocados pela broca-do-colmo tem ocasionado redução na produtividade de 10%.

Não existe inseticida registrado para o controle da broca-do-colmo em arroz.

Entre as principais espécies de inimigos naturais destacam-se as aranhas.
Entre as principais espécies de inimigos naturais destacam-se as aranhas.

Manejo

A incorporação da resteva e eliminação das plantas daninhas, nas ruas, taipas e bordas da lavoura, vai auxiliar na redução da população. A grama existente nestas áreas deve ser apenas cortada, com o objetivo de manter os inimigos naturais.

A rotação de culturas, além de melhorar a produtividade, auxilia no controle das pragas. Neste sistema deve ser semeada uma cultura da qual o inseto não se alimenta. Nas áreas de arroz esta medida está sendo adotada com sucesso, com a utilização da cultura da soja.

A irrigação correta exige uma lâmina de água cobrindo todas as partes da lavoura, pois áreas secas favorecem o desenvolvimento dos insetos-pragas. O manejo para reduzir os danos do pulgão-da-raiz passa pela colocação de uma lâmina de água alta durante uma semana.

O controle químico deve ser adotado quando os níveis populacionais podem causar perdas. Na escolha do produto é importante aplicar defensivos com registro, eficientes e  com baixa toxicidade. O uso de não seletivos resulta na eliminação dos insetos benéficos e pode ocorrer que uma espécie sem importância torne-se uma praga primária.  Nunca aplicar por vários anos o mesmo produto, pois pode causar resistência.

Espécies de lagarta-da-panícula, praga cujo período crítico vai do florescimento até a colheita.
Espécies de lagarta-da-panícula, praga cujo período crítico vai do florescimento até a colheita.

A aplicação sequencial

O uso de inseticidas aplicados preventivamente em mistura com fungicidas é incorreto e muitas vezes não é eficiente, podendo aumentar o custo de produção e afetar os inimigos naturais. Manejar corretamente não quer dizer empregar produtos com maior frequência e sem critério técnico.

 

Jaime Vargas de Oliveira, UNITEC; Danielle Almeida, IRGA; Lidia Fiuza, IRGA; Paulo Luciano Pereira de Siqueira, PAVA Consultoria


Artigo publicado na edição 207 da Cultivar Grandes Culturas.

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