Critérios de seleção

Veja aqui dicas de especialista para a hora de escolher uma nova máquina agrícola. A tomada de decisão não é simples, pois um erro de grandes dimensões pode deixar envididado o produtor rural.

10.11.2015 | 21:59 (UTC -3)

O momento da compra de uma nova máquina agrícola é sempre tomado com preocupação pelo agricultor. Ele sabe da necessidade, vê perspectivas de melhorias no seu sistema de produção, mas preocupa-se com a capacidade de endividamento e com o retorno econômico que esta compra pode trazer. Isto se ele estiver convencido da qualidade técnica e da propriedade da escolha do modelo.

Imaginamos ser difícil esta tomada de decisão, pois a situação econômica da agricultura no Brasil não permite riscos e um erro de grandes dimensões pode ser fatal para a continuidade do negócio.

Nos parecem claros dois motivos que podem servir para que consideremos com mais cuidado a seleção de tratores e máquinas agrícolas:

• Como é impossível ou muito difícil controlar as variações e quedas do valor de comercialização do produto agrícola, pode-se reduzir o custo de produção, utilizando eficientemente os insumos de mecanização, liberando receitas para o lucro. Isto representa comprar máquinas baratas em manutenção, que não ocasionem investimentos adicionais inúteis ou com pequena utilidade para o sistema produtivo do agricultor. Existem máquinas que oferecem recursos, opcionais e acessórios que nada mais fazem a não ser encarecer o produto, o que acaba onerando o agricultor durante toda a vida útil da máquina. Assim, tomar cuidado com as ofertas de tecnologia é uma boa decisão. Uma máquina tecnologicamente desenvolvida é aquela que executa o seu objetivo funcional com o máximo rendimento e com a mínima intervenção em manutenção e ajustes.

• O custo de mecanização pode incidir em até 40% sobre o custo de produção, sendo então um item de importância na racionalização econômica e minimização de custos. Estudos realizados para a avaliação dos custos de produção de determinadas culturas indicam que a mecanização sempre se constitui como um dos itens mais importantes. A máquina está envolvida em quase todas as etapas da produção e, em algumas, com muita intensidade. Muitos agricultores preocupam-se com informação para a compra de insumos que influem pouco no seu custo final e esquecem a máquina que está sempre trabalhando e muitas vezes acumulando prejuízos.

Na utilização de máquinas agrícolas, algumas de suas características podem servir como uma advertência técnica, para a nossa análise:

• As máquinas agrícolas têm uma prolongada vida útil (anos), assim os equipamentos agrícolas, quando forem mal dimensionados, poderão vir a ser uma penalização muito difícil de ser evitada em um médio prazo. Um agricultor que compra erradamente um produto, seja por uma má indicação ou por falta de qualidade do produto, ficará com este bem durante muitos anos, onerando o seu custo de produção;

• Outro problema é que uma vez adquirido um produto sub ou superdimensionado, este provocará custos extras que terão de ser absorvidos pelo empresário no seu dia-a-dia.

Alguns problemas são inerentes à mecanização:

Trator é uma máquina pouco agrícola

O trator é um veículo de tração bastante desenvolvido, mas pouco adaptado às condições de trabalho a que ele é submetido nas operações agrícolas. Para entender isto, pode-se enumerar vários pontos, entre os quais destacamos a elevada altura do centro de gravidade, os problemas relacionados à aderência e à dificuldade em adapta-lo ao trabalho e às exigências dos implementos, como exemplo lembra-se também a operação de lastragem e alteração de bitola.

Falta de conhecimento do produto

O nível de informação contido nos manuais e repassado ao comprador é bastante bom para as operações de manutenção e extremadamente insuficiente para conseguir uma boa operação. Também o nível, a quantidade e a qualidade das informações técnicas são bastante ruins, pois como não temos obrigatoriedade de ensaios oficiais no nosso país, a informação é de exclusiva responsabilidade dos fabricantes. Em determinados países é obrigatória a apresentação de laudos técnicos que qualifiquem o equipamento, para que este possa receber benefícios de crédito oficial.

O meio é muito variável, A máquina não

O meio para o qual a máquina foi projetada é idealizado para favorecer o projeto, mas em realidade, quando da aplicação, as máquinas enfrentam uma grande diversidade de condições de solo, clima, cultura, sistemas de produção e um variável grau de conhecimento por parte do operador.

Ciclos de produção longos

Diferentemente da produção industrial, na agricultura o ciclo de produção é muito longo, demorando meses para que se colha uma cultura, passando diferentes estações, em condições de produção aberta, como se fosse uma fábrica sem teto, onde máquinas operatrizes estão com seus operadores expostos ao clima.

Baixa utilização anual

As máquinas agrícolas, embora fabricadas com um processo semelhante a outros produtos mecânicos têm uma baixa utilização anual, por exemplo, 500 horas/ano para um trator, 200 horas/ano para uma colhedora. Para o caso do trator, isto representa em torno de 5,4 % do tempo total empregado enquanto que em comparação um torno mecânico, em uma indústria, em uma utilização normal, trabalha aproximadamente 43 % do tempo total.

"Assim, a seleção de equipamentos agrícolas passa ser uma combinação entre o que o agricultor crê que necessita, e o que o fabricante e o revendedor crêem que os agricultores deveriam necessitar, de uma linha de produtos, que eles podem fabricar e revender com certa margem de lucratividade". Dr. Luis Márquez – Universidade Politécnica de Madrid

O desafio para o produtor moderno, que queira além de sobreviver, progredir economicamente, passa por:

• Selecionar os equipamentos pela sua necessidade, com critérios técnicos e econômicos;

• Encontrar equipamentos adequados para a sua situação particular, "o que serve para a maioria não necessariamente é o melhor para todo o agricultor";

• Comprar um equipamento de custo compatível. Analisar a possibilidade de compra e a capacidade de pagamento;

• Utilizar o equipamento de modo a proporcionar menores custos. Investir em treinamento de operadores e qualificar a informação técnica.

Também é muito importante que o agricultor crie condições internas para receber e utilizar o equipamento agrícola que está sendo incorporado ao seu patrimônio. Neste sentido são bastante importantes as questões relacionadas ao armazenamento da máquina e ao treinamento dos operadores.

O armazenamento tem caráter preventivo quanto aos fatores de deterioração que o meio ambiente e as intempéries provocam às partes constituintes da maquinaria agrícola. Os metais podem oxidar-se, as borrachas e os plásticos sofrerem ressecamento etc. Na nossa região são mais comuns os galpões abertos, encontrados em 44% das vezes, em pesquisa recente feita UFSM. Também foram encontrados 30% das ocorrências de galpões de madeira fechados e 18% de construções fechadas de alvenaria. Também foram encontrados 5% de propriedades onde todo o equipamento ficava exposto às intempéries. Neste sentido, cabe ressaltar que alguns equipamentos como os tratores, as colhedoras, as semeadoras e os pulverizadores, entre outros, devem ficar protegidos das intempéries, mesmo considerando os altos custos destas construções. Os arados, as grades, e outros implementos de simples construção não justificam economicamente o armazenamento em condições de cobertura.

Quanto à formação técnica dos operadores de máquinas, em outra pesquisa realizada recentemente, foi demonstrada a frágil situação agrícola regional. Enquanto que o nível de escolaridade demonstra que 59% possuem primeiro grau incompleto e 20% possuem este mesmo grau completo, somente 1,42% são analfabetos, isto é, incapacitados de ter acesso ao material técnico fornecido pelos fabricantes. Quanto ao treinamento, 47% tiveram o treinamento inicial com seus familiares e somente 22% participaram de treinamento formal em cursos ou jornadas promovidas por fabricantes, centros de treinamento, extensionistas etc.

Atualmente o critério de fidelidade dos agricultores com a marca pode estar sendo difícil de ser aplicado. Com a globalização no mundo das máquinas agrícolas, alguns fabricantes, buscando ampliar a escala de produção, passaram a unir-se em empresas mundiais, que intercambiam componentes, com o objetivo de horizontalizar a produção. Cada vez mais os fabricantes de tratores são montadores, deixando de produzir componentes que outro fornecedor que poderia ser concorrente, pode fazer e esteja disposto a vender.

Alguns são conhecidos como construtores de motores, outros são especializados em transmissões e, neste sentido, ocorrem as uniões e incorporações.

Uma empresa italiana chamada Agritália passou a fornecer os modelos de tratores estreitos para frutíferas na Europa para Case-IH, Deutz Fahr, John Deere, Renault e Valtra. Quer dizer, o mesmo trator estreito fabricado por ela trocava de cor e passava a ser de diferentes marcas. Algo impensável há tempos atrás. Um joint venture entre Claas e Catterpilar fazia com que o modelo de trator de esteira de borracha, modelo Challenger, fosse vendido com as cores da Claas para o mercado Europeu e a colhedora de grãos da Class, pintada de amarelo, fosse vendida no mercado americano como Catterpilar. O mesmo ocorre entre Landini e Massey Ferguson na Itália, onde os tratores podem ser pintados de azul e vermelho dependendo de que rede de concessionários os irá vender.

Em transmissões, a Funk, que pertence ao grupo John Deere, fabrica transmissões que equipam tratores da John Deere, MF e New Holland no mercado europeu. A Gima, que pertence metade à Renault e metade à MF, equipa tratores de ambas marcas. A Steyer, de origem austríaca, fabrica caixas de câmbio que podem equipar tanto tratores da Case/Steyer como da Deutz Fahr.

Os motores igualmente trazem surpresas nas associações. A marca Cummins equipa máquinas da John Deere e da MF. Os Deere aparecem em máquinas da Renault. Os Volvo equipam Massey Ferguson e Case-IH na Europa e os MWM aparecem em modelos da Fendt, Steyer e Valtra.

Finalmente, devem ser analisados os grandes conglomerados de empresas, como a AGCO que engloba marcas que antes eram concorrentes diretos e em alguns locais mantém a sua independência comercial, como Massey Ferguson, AGCO-Allis, Deutz e Fendt. Há também a CNH que une forças em concessionários vendendo Case-IH, Steyer e Hew Holland, muitas vezes competindo entre si. Também há a SAME, italiana que em uma mesma fábrica monta tratores SAME, Lamborghini e Hurlimann.

A justificativa para tal comportamento é que no comércio de máquinas e equipamentos há três razões básicas para não se lutar só:

• Pequeno volume de comercialização para unidades motoras e de transmissão. O número de motores e transmissão vendidos com os tratores e colhedoras é pequeno em comparação aos automóveis, ficando difícil a competitividade;

• Alto custo de desenvolvimento de projetos novos e com adaptação à agricultura. Quanto mais um projeto for deduzido em seus custos, melhor. Assim, os projetos de componentes devem ficar o maior tempo possível no mercando, ocasionando ao final um benefício para o agricultor;

• Penetração e disputa pelos mesmos mercados em todo mundo. Certos fabricantes aproveitam-se destas associações para abrir e explorar mercados que não eram seus antes da associação.

Partindo-se do princípio regional de que 77,5% dos agricultores compram tratores novos, está cada vez mais difícil manter esta fidelidade à marca, visto que embora aparentemente concorrentes alguns fabricantes estão unidos em escala de fabricação.

Em resumo, gostaríamos de ressaltar a importância de realizar-se um estudo mais detalhado no momento da compra de equipamentos agrícolas, principalmente os de maior valor. O agricultor deve estabelecer uma matriz de critérios que deve considerar neste momento importante. No próximo número trataremos de colocar em apreciação os critérios, principalmente objetivos e técnicos que deverão ser considerados. Assim, como se diz no futebol que o pênalti é tão importante que deveria ser chutado pelo presidente do clube, a aquisição de equipamentos deve ser tratada com muita responsabilidade pelo próprio empresário.

José Fernando Schlosser,

NEMA / UFSM

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