A mosca-branca-das-estufas, Trialeurodes vaporariorum (Westwood, 1856), é uma das pragas agrícolas mais significativas em sistemas de cultivo protegido. Pertencente à ordem Hemiptera, família Aleyrodidae, este pequeno inseto de aproximadamente 1,5 a 2,0 mm de comprimento tem causado prejuízos econômicos substanciais à agricultura moderna, especialmente em cultivos de hortaliças e plantas ornamentais. Sua importância transcende os danos diretos causados pela alimentação, atuando também como vetor de importantes fitopatógenos virais. O entendimento aprofundado de seus aspectos taxonômicos, biológicos e ecológicos é fundamental para o desenvolvimento de estratégias de manejo integrado eficazes e sustentáveis.
Posição taxonômica
Trialeurodes vaporariorum foi descrita originalmente por John Obadiah Westwood em 1856, sendo o epíteto específico "vaporariorum" derivado do latim e referente às estufas aquecidas a vapor onde o inseto foi primeiramente observado causando danos em cultivos protegidos na Inglaterra durante o século XIX. A espécie está classificada taxonomicamente no reino Animalia, filo Arthropoda, classe Insecta, ordem Hemiptera, subordem Sternorrhyncha, superfamília Aleyrodoidea, família Aleyrodidae, subfamília Aleyrodinae e gênero Trialeurodes.
A família Aleyrodidae, conhecida popularmente como moscas-brancas, compreende aproximadamente 1.500 espécies descritas distribuídas em cerca de 160 gêneros. São insetos hemimetábolos altamente especializados em alimentação por sucção de seiva do floema, caracterizados por corpo pequeno coberto por secreções cerosas brancas, quatro asas membranosas recobertas por cera pulverulenta, aparelho bucal sugador-picador e ninfas sésseis com formato achatado.
Trialeurodes vaporariorum pode ser distinguida morfologicamente de outras moscas-brancas, especialmente de Bemisia tabaci, sua principal espécie congênere de importância agrícola, através de características específicas. Os adultos mantêm as asas quase horizontalmente e paralelas ao substrato quando em repouso, sem espaço visível entre elas, enquanto B. tabaci mantém as asas formando um ângulo semelhante a um telhado. O pupário de T. vaporariorum apresenta formato oval com paredes verticais e tubérculos cerosos dorsais bem desenvolvidos, além de cobertura cerosa branca mais abundante e conspícua. O tamanho ligeiramente maior e a maior tolerância a baixas temperaturas também diferenciam as duas espécies, sendo T. vaporariorum mais adaptada a ambientes de estufa em regiões temperadas, enquanto B. tabaci predomina em climas quentes.
Ciclo de vida
O ciclo de vida de Trialeurodes vaporariorum apresenta metamorfose incompleta, compreendendo as fases de ovo, quatro estádios ninfais e adulto. A duração do ciclo completo é fortemente influenciada pela temperatura, variando de aproximadamente 60 dias a 15°C até 18-21 dias em condições ótimas de 27-30°C. Abaixo de 10°C o desenvolvimento praticamente cessa, enquanto acima de 32°C a mortalidade aumenta significativamente.
As fêmeas depositam os ovos preferencialmente na face inferior das folhas, inserindo-os verticalmente no tecido foliar através de um pequeno pedúnculo. Os ovos possuem formato alongado, medindo aproximadamente 0,2 mm de comprimento, e inicialmente apresentam coloração branco-amarelada, tornando-se acinzentados ou enegrecidos próximo à eclosão. Uma fêmea pode depositar entre 150 a 500 ovos ao longo de sua vida, com oviposição média de 10-20 ovos por dia, frequentemente arranjados em padrões semicirculares ou circulares nas folhas. O período de incubação varia de 5 a 14 dias, dependendo da temperatura.
Após a eclosão, as ninfas passam por quatro ínstares, sendo que uma característica fundamental da biologia das moscas-brancas é que, após o primeiro ínstar móvel (crawler), as ninfas tornam-se sésseis, permanecendo fixas no mesmo local da folha onde se estabeleceram. O primeiro ínstar, único estágio ninfal com mobilidade, mede aproximadamente 0,3 mm, possui pernas funcionais e antenas, movimenta-se pela folha procurando local adequado para fixação e, após inserir o estilete, permanece fixo por 2-4 dias. O segundo e terceiro ínstares são completamente sésseis, com corpo achatado, oval e translúcido a amarelado, alimentando-se continuamente de seiva do floema através de estiletes que podem atingir 3-4 vezes o comprimento do corpo, com duração de 2-4 dias cada.
O quarto ínstar, denominado pupário ou pseudo-pupa, é diferenciado e possui características únicas. O corpo torna-se mais espesso e convexo, ocorre o desenvolvimento de características adultas internamente, apresenta tubérculos cerosos dorsais conspícuos, paredes laterais quase verticais, coloração branco-amarelada a translúcida e olhos vermelhos que tornam-se visíveis antes da emergência. Este estágio dura de 7 a 15 dias e é chamado "pupário" porque superficialmente lembra uma pupa, embora tecnicamente seja um ínstar ninfal onde ocorre transformação para adulto.
Os adultos emergem através de uma fenda em forma de "T" no dorso do pupário, com machos geralmente emergindo antes das fêmeas. A reprodução é sexuada, com cópula ocorrendo logo após a emergência, e a proporção sexual geralmente apresenta ligeira predominância de fêmeas. As fêmeas vivem de 20 a 40 dias em condições favoráveis, enquanto os machos geralmente vivem menos, de 10 a 20 dias, sendo a longevidade fortemente dependente de temperatura, umidade e qualidade do hospedeiro.
Trialeurodes vaporariorum alimenta-se exclusivamente de seiva do floema, rica em açúcares mas pobre em aminoácidos. Para obter proteínas suficientes, os insetos precisam ingerir grandes volumes de seiva, excretando o excesso de açúcares na forma de honeydew (melada). O processo envolve inserção do estilete através dos tecidos foliares, navegação intercelular até atingir os vasos do floema, sucção contínua da seiva elaborada e excreção de honeydew através do ânus. As consequências dessa alimentação incluem debilitação da planta por perda de nutrientes e fotoassimilados, clorose foliar por dano aos tecidos, desenvolvimento de fumagina (crescimento do fungo Capnodium sp.) sobre o honeydew reduzindo a fotossíntese, deformações por crescimento irregular de tecidos jovens e transmissão de vírus durante a alimentação.
A espécie é polífaga, atacando mais de 200 espécies vegetais de diferentes famílias botânicas, com preferência especial por Solanaceae (tomate, pimentão, berinjela, batata), Cucurbitaceae (pepino, melão, abóbora), Fabaceae (feijão, ervilha), Asteraceae (alface, gerbera) e diversas ornamentais. A seleção do hospedeiro é influenciada por compostos químicos foliares, densidade de tricomas, espessura da cutícula e estado nutricional da planta.
Devido ao ciclo curto em temperaturas elevadas e alta fecundidade, T. vaporariorum possui enorme potencial biótico. Em condições ótimas de estufa, podem ocorrer 12-15 gerações por ano, com crescimento populacional exponencial e sobreposição de gerações. Uma única fêmea pode teoricamente originar milhões de descendentes em uma temporada, explicando as explosões populacionais frequentemente observadas em cultivos protegidos.
Aspectos ecológicos
Trialeurodes vaporariorum possui distribuição cosmopolita, ocorrendo em todos os continentes exceto Antártida. Originária provavelmente da região neotropical, a espécie dispersou-se globalmente através do comércio internacional de plantas. Em regiões temperadas, predomina em cultivos protegidos (estufas), enquanto em regiões subtropicais ocorre tanto em estufas quanto em campo aberto. Em regiões tropicais, sua ocorrência é mais restrita devido à competição com Bemisia tabaci. A espécie é particularmente importante na Europa, América do Norte, Japão, Austrália, Nova Zelândia e partes da América do Sul, especialmente em sistemas de produção sob cultivo protegido.
O nicho ecológico de T. vaporariorum caracteriza-se pela preferência por estufas e casas de vegetação em regiões temperadas, cultivos protegidos como túneis plásticos e telados, áreas sombreadas com menor exposição à radiação solar direta e microclimas úmidos com vegetação densa. As condições ambientais ideais incluem temperatura de 24-28°C, umidade relativa de 65-85%, luminosidade moderada, ausência de ventos fortes e disponibilidade contínua de tecido vegetal jovem. Esta preferência por ambientes protegidos relaciona-se à sensibilidade da espécie a temperaturas extremas, ventos fortes e chuvas intensas.
T. vaporariorum ocupa posição de consumidor primário (herbívoro especializado em floema) na cadeia alimentar, servindo como base para múltiplos níveis tróficos superiores. A espécie está inserida em complexas redes tróficas envolvendo diversos grupos de artrópodos e microrganismos entomopatogênicos.
Entre os inimigos naturais mais importantes estão os parasitoides, especialmente Encarsia formosa, principal parasitoide amplamente utilizado em controle biológico, cujas fêmeas depositam ovos dentro das ninfas de terceiro e quarto ínstares, tornando o pupário parasitado caracteristicamente preto. Outros parasitoides relevantes incluem Encarsia tricolor, Encarsia pergandiella, Eretmocerus eremicus e Eretmocerus mundus.
Diversos predadores atacam todas as fases de T. vaporariorum, incluindo joaninhas como Delphastus catalinae (predador especialista altamente eficiente), Cycloneda sanguinea e Coleomegilla maculata; percevejos mirídeos como Macrolophus pygmaeus e Nesidiocoris tenuis; larvas de crisopídeos (Chrysoperla spp.); larvas de sirfídeos; e diversas aranhas que capturam adultos em teias.
Microrganismos entomopatogênicos também desempenham papel importante, destacando-se fungos como Beauveria bassiana, Metarhizium anisopliae, Verticillium lecanii, Isaria fumosorosea e Aschersonia aleyrodis.
A interação ecológica mais estudada é a competição com Bemisia tabaci, havendo sobreposição de nichos em regiões subtropicais e tropicais, com exploração dos mesmos hospedeiros e tecidos vegetais. A competição é assimétrica, favorecendo B. tabaci em temperaturas elevadas. Em muitas regiões onde ambas espécies coexistiram, B. tabaci tem progressivamente deslocado T. vaporariorum, sendo mais competitiva em temperaturas acima de 28°C, com maior capacidade de induzir defesas vegetais que prejudicam competidoras, maior eficiência no uso de hospedeiros e tolerância superior a estresses ambientais. Onde coexistem, T. vaporariorum domina em cultivos protegidos de clima temperado e porções mais baixas da planta, enquanto B. tabaci domina em condições quentes, campo aberto e porções superiores da planta.
A dinâmica populacional de T. vaporariorum segue padrões característicos influenciados por múltiplos fatores. Em ambientes protegidos, observa-se crescimento populacional exponencial em condições favoráveis, ausência de sazonalidade marcada com reprodução contínua, picos populacionais relacionados à fenologia das culturas e flutuações abruptas associadas a manejos. Em campo aberto em regiões temperadas, há padrão sazonal marcado com crescimento populacional na primavera-verão, declínio no outono-inverno e diapausa ou sobrevivência em plantas daninhas. A distribuição espacial é tipicamente agregada, com preferência pela porção média-inferior das plantas e face inferior das folhas, próximo às nervuras principais.
Importância agrícola
A mosca-branca é uma praga extremamente relevante por causar danos diretos e indiretos às plantas. Os danos diretos ocorrem pela sucção contínua de seiva através de seu aparelho bucal sugador-picador, o que enfraquece as plantas, causa amarelecimento foliar e reduz o vigor vegetativo. Durante a alimentação, o inseto excreta substâncias açucaradas que favorecem o desenvolvimento de fumagina, um fungo negro que compromete a fotossíntese e deprecia o valor comercial dos produtos.
Os danos indiretos são ainda mais preocupantes, pois T. vaporariorum atua como vetor de diversos vírus fitopatogênicos, transmitindo doenças que podem devastar cultivos inteiros. Entre os vírus transmitidos estão Crinivirus da família Closteroviridae, como Beet pseudo-yellows virus (BPYV), Lettuce infectious yellows virus (LIYV) e Tomato chlorosis virus (ToCV), além de Torradovirus como Tomato torrado virus (ToTV). A transmissão desses vírus ocorre de forma semi-persistente, com o inseto permanecendo virulífero por horas a dias.
A ecologia da mosca-branca determina padrões epidemiológicos importantes. A taxa de transmissão viral relaciona-se à densidade do vetor e tempo de alimentação, a dispersão de patógenos ocorre através da movimentação de adultos virulíferos, plantas daninhas e cultivadas mantêm vírus entre ciclos como reservatórios, e epidemias são facilitadas por alta densidade populacional e cultivos sucessivos. A capacidade vetorial torna T. vaporariorum não apenas praga direta, mas também facilitadora de doenças com impacto econômico frequentemente superior aos danos diretos da alimentação.
A intensificação agrícola tem impactos significativos sobre as populações de mosca-branca. Monoculturas extensas proporcionam disponibilidade contínua de hospedeiros favorecendo as populações, ausência de diversidade vegetal reduz inimigos naturais e facilita a dispersão entre plantas. O cultivo protegido oferece ambiente ideal com temperatura controlada, ausência de chuva e vento, exclusão parcial de inimigos naturais e permite populações perenes sem diapausa invernal. A fertilização nitrogenada excessiva aumenta a qualidade nutricional para mosca-branca, produz tecidos suculentos mais suscetíveis e favorece microclimas úmidos pelo crescimento vegetativo excessivo.
A pressão seletiva por uso intensivo de inseticidas resultou em evolução de resistência através de mecanismos como mutações em sítios-alvo, superexpressão de enzimas detoxificadoras, redução da penetração cuticular e alterações comportamentais. As consequências ecológicas incluem redução da eficácia de controle químico, aumento de dosagens e frequências de aplicação, impacto negativo em inimigos naturais e desequilíbrio ecológico favorecendo ressurgências.