
O thiram (tetrametiltiuram dissulfeto) é um fungicida de contato multissítio. Pertence ao grupo químico dos ditiocarbamatos. Destaca-se pela eficácia no controle preventivo de doenças fúngicas em diversas culturas agrícolas, especialmente no tratamento de sementes e controle de patógenos de solo.
O desenvolvimento do thiram remonta à década de 1930, quando emergiu como uma das primeiras gerações de fungicidas orgânicos sintéticos. Sua introdução comercial nos anos 1940 representou um marco significativo na fitopatologia aplicada, oferecendo alternativa eficaz aos fungicidas tradicionais à base de cobre e enxofre.
Modo de ação
O thiram opera através de um mecanismo de ação multissítio altamente complexo, interferindo simultaneamente em múltiplos processos metabólicos essenciais dos fungos fitopatogênicos. O mecanismo primário fundamenta-se na inibição irreversível de enzimas contendo grupos sulfidrilas (-SH), componentes essenciais para o metabolismo celular fúngico. Esta interação química irreversível resulta em disfunção enzimática generalizada, comprometendo a viabilidade celular dos patógenos.
Os alvos bioquímicos primários incluem enzimas da cadeia respiratória mitocondrial, sistemas de transporte de elétrons e enzimas fundamentais envolvidas na síntese de ácidos nucleicos. A interação específica com grupos sulfidrilas de resíduos de cisteína em proteínas estruturais e enzimáticas compromete irreversivelmente a integridade celular e os processos metabólicos fundamentais dos fungos.
A classificação do thiram no código FRAC M3 o posiciona como fungicida de atividade multissítio, característica que confere baixíssimo risco de desenvolvimento de resistência. Esta propriedade singular resulta da ação simultânea em múltiplos sítios bioquímicos, tornando praticamente impossível o desenvolvimento de resistência cruzada por parte dos patógenos target. Consequentemente, o thiram assume papel estratégico em programas de manejo de resistência, servindo como produto de rotação ou mistura com fungicidas sítio-específicos.
As consequências fisiológicas nos patógenos expostos ao thiram manifestam-se através de interrupção completa da respiração celular, comprometimento severo da síntese proteica, desorganização estrutural da membrana celular, inibição da germinação de esporos e formação de apressórios defeituosos. Estes efeitos sinérgicos culminam na morte celular ou redução drástica da capacidade infectiva dos propágulos fúngicos.
Espectro de controle
O thiram demonstra eficácia comprovada contra um amplo espectro de patógenos fúngicos em diversas culturas de importância econômica. Em cereais como trigo, cevada e aveia, o princípio ativo controla efetivamente Fusarium graminearum (agente causal da giberela), Bipolaris sorokiniana (mancha-marrom) e Pyricularia oryzae (brusone), utilizando doses entre 200-300 g i.a./100 kg sementes no tratamento de sementes.
Na cultura da soja, o thiram apresenta particular relevância no controle de Sclerotinia sclerotiorum (mofo-branco), Cercospora kikuchii e Phomopsis spp., com dosagens recomendadas de 200-250 g i.a./100 kg sementes.
Para o milho, demonstra eficiência contra Fusarium verticillioides e Stenocarpella maydis, empregando doses de 250-350 g i.a./100 kg sementes.
Em hortaliças, o thiram controla satisfatoriamente Alternaria spp. (alternariose) e Botrytis cinerea (mofo-cinzento), utilizando aplicações foliares de 1,5-2,5 kg p.c./ha.
Na fruticultura, destaca-se no controle de Monilinia fructicola e Taphrina deformans, com doses de 2,0-3,0 kg p.c./ha.
Os intervalos de segurança estabelecem período de carência (PHI) entre 7-21 dias, variando conforme a cultura e formulação utilizada, enquanto o intervalo de reentrada (REI) situa-se entre 24-48 horas, garantindo segurança ocupacional adequada.
Gerenciamento da resistência
O thiram ocupa posição singular no contexto de gerenciamento de resistência a fungicidas, apresentando histórico mundial praticamente isento de casos confirmados de resistência em condições de campo. Esta característica excepcional deriva diretamente de seu mecanismo de ação multissítio, que torna extremamente improvável o desenvolvimento de resistência cruzada por parte dos patógenos.
No Brasil, o monitoramento sistemático conduzido pela rede FRAC-BR não identificou populações resistentes significativas ao thiram, confirmando sua estabilidade como ferramenta de controle. Esta estabilidade posiciona o thiram como componente fundamental em programas anti-resistência, servindo como âncora para preservação da eficácia de fungicidas sítio-específicos de maior valor agregado.
As estratégias de rotação recomendadas incluem alternância com fungicidas dos grupos FRAC G (triazóis), C (benzimidazóis) e F (anilinas), enquanto as misturas mostram-se compatíveis com estrobilurinas (Grupo 11) e triazóis (Grupo 3). A utilização do thiram como âncora em programas anti-resistência representa abordagem estratégica fundamental para sustentabilidade do controle químico.
Quanto ao manejo de doses, recomenda-se invariavelmente a utilização da dose máxima estabelecida para maximizar eficácia e minimizar qualquer possibilidade de seleção de populações menos sensíveis. A redução de dose compromete significativamente a performance e pode favorecer o desenvolvimento de tolerância em patógenos target.
Segurança e impacto ambiental
A avaliação toxicológica do thiram o classifica na Classe Toxicológica II (altamente tóxico), com DL50 oral entre 560-865 mg/kg em ratos. O princípio ativo apresenta potencial sensibilizante dérmico e efeito irritante ocular moderado, exigindo equipamentos de proteção individual adequados durante aplicação.
Do ponto de vista ambiental, o thiram apresenta características favoráveis de degradação e mobilidade. A meia-vida no solo varia entre 7-30 dias, dependendo de fatores como temperatura, umidade e pH, sendo a degradação primariamente microbiana, gerando dióxido de carbono e dimetilamina como produtos finais. O coeficiente de partição (Koc) elevado, situando-se entre 1.200-2.400 mL/g, indica baixa mobilidade no perfil do solo.
O potencial de lixiviação e contaminação de águas subterrâneas é considerado baixo devido ao Koc elevado e rápida degradação microbiana. A solubilidade limitada em água (30 mg/L a 25°C) contribui adicionalmente para reduzir o risco de contaminação de aquíferos. Estudos ambientais demonstram concentrações residuais mínimas em águas subterrâneas quando o produto é aplicado seguindo boas práticas agrícolas.
Interações e compatibilidades
A compatibilidade de misturas em tanque do thiram abrange estrobilurinas como azoxistrobina e piraclostrobina, triazóis incluindo tebuconazole e propiconazole, além de fertilizantes foliares neutros ou levemente ácidos. Entretanto, apresenta incompatibilidades significativas com produtos alcalinos (pH > 8,0), óleos minerais em concentrações elevadas e fungicidas cúpricos, devido ao risco de fitotoxicidade.
O potencial fitotóxico do thiram manifesta-se particularmente em variedades sensíveis de cucurbitáceas, aplicações em condições de alta temperatura (superior a 30°C), situações de sobredosagem em plantas jovens e quando combinado com adjuvantes oleosos. Estas limitações exigem cuidados específicos no planejamento aplicativo.
Eficácia agronômica
A eficácia do thiram é influenciada por diversos fatores ambientais e operacionais. Condições favoráveis incluem alta umidade relativa (superior a 80%), temperaturas amenas (15-25°C) e aplicação preventiva anterior ao processo de infecção. Por outro lado, fatores limitantes compreendem chuvas intensas 4-6 horas após aplicação, temperaturas extremas (inferiores a 10°C ou superiores a 35°C) e exposição UV prolongada devido à degradação fotolítica.
As vantagens competitivas do thiram incluem ação multissítio com baixo risco de resistência, amplo espectro de controle, efeito residual adequado (7-14 dias), relação custo-benefício favorável e compatibilidade com programas de manejo integrado de pragas. As limitações abrangem ação exclusivamente preventiva, potencial fitotóxico em condições específicas, restrições toxicológicas para aplicadores e performance reduzida contra patógenos sistêmicos.
O posicionamento estratégico em diferentes sistemas agrícolas varia conforme as especificidades culturais. Na soja, o thiram é empregado primariamente no tratamento de sementes combinado com aplicações foliares preventivas durante o início do enchimento de grãos (R3-R4), especialmente visando o controle de Sclerotinia sclerotiorum. No milho, o tratamento de sementes representa aplicação padrão, complementado por aplicações foliares em híbridos suscetíveis a Exserohilum turcicum durante V6-V8.
Para o algodão, aplicações preventivas durante a formação de botões florais integram programas de controle de Alternaria spp. Na cana-de-açúcar, o tratamento de mudas pré-plantio visa o controle de patógenos de solo, especialmente Fusarium spp. No café, aplicações preventivas durante o período chuvoso controlam Cercospora coffeicola e Hemileia vastatrix, em rotação com triazóis.
Em trigo, o thiram constitui componente essencial do tratamento de sementes, complementado por aplicações foliares durante o perfilhamento em regiões de alta pressão de Pyricularia oryzae. Para hortaliças, aplicações semanais preventivas em cultivos protegidos demonstram particular eficácia contra Botrytis cinerea em solanáceas e cucurbitáceas.
Na fruticultura, aplicações dirigidas durante dormência e brotação controlam Taphrina deformans em frutíferas de caroço, enquanto programas preventivos combatem Monilinia spp. em pré-colheita.