Bacillus velezensis

28.07.2025 | 16:07 (UTC -3)

Bacillus velezensis é uma bactéria gram-positiva, formadora de esporos, que emergiu como um dos microrganismos mais promissores para aplicações em agricultura sustentável. Descrita inicialmente em 2005, esta espécie tem despertado crescente interesse científico e comercial devido às suas múltiplas propriedades benéficas.

Taxonomia e classificação

Bacillus velezensis pertence ao domínio Bacteria, filo Firmicutes, classe Bacilli, ordem Bacillales, família Bacillaceae.

Dentro do gênero Bacillus, a espécie integra o complexo B. subtilis, um grupo de espécies estreitamente relacionadas que inclui B. subtilis, B. amyloliquefaciens, B. siamensis e B. nakamurai.

Esta proximidade filogenética tem implicações importantes para a identificação taxonômica e compreensão das relações evolutivas dentro do grupo.

A espécie foi originalmente descrita por Ruiz-García et al. (2005) com base em isolados obtidos de uma fonte termal na Espanha. O epíteto específico "velezensis" homenageia o microbiologista espanhol Fernando Vélez, reconhecendo suas contribuições significativas à microbiologia. A descrição original baseou-se em características morfológicas, bioquímicas e análises de sequências do gene 16S rRNA, seguindo os critérios taxonômicos estabelecidos para o gênero Bacillus.

A taxonomia de B. velezensis passou por revisões significativas com o advento das técnicas de sequenciamento genômico. Uma das mudanças mais impactantes ocorreu quando análises filogenéticas baseadas em genomas completos revelaram que muitas linhagens anteriormente classificadas como B. amyloliquefaciens subsp. plantarum eram, na verdade, mais próximas de B. velezensis. Esta reclassificação afetou importantes linhagens comerciais, incluindo FZB42, QST713 e muitas outras utilizadas em produtos de biocontrole.

A identificação precisa de B. velezensis requer abordagens moleculares devido à alta similaridade fenotípica com outras espécies do complexo B. subtilis. Os critérios modernos de diferenciação baseiam-se em análises de índices de nucleotídeos médios (ANI), hibridização digital DNA-DNA (dDDH) e análises filogenéticas multilocus. Genes marcadores como gyrA, rpoB e cheA são frequentemente utilizados para identificação específica, enquanto técnicas como MALDI-TOF MS oferecem alternativas rápidas para identificação rotineira.

Biologia e fisiologia

Bacillus velezensis apresenta morfologia típica do gênero Bacillus, com células em forma de bastonete medindo aproximadamente 0,5-1,2 μm de largura por 2-5 μm de comprimento.

Como bactéria gram-positiva, possui parede celular espessa rica em peptidoglicano, conferindo resistência mecânica e forma celular definida. As células podem ocorrer isoladamente, em pares ou formar cadeias curtas, especialmente durante fases de crescimento ativo.

A característica morfológica mais distintiva é a capacidade de formar endósporos elipsoidais, centrais ou subterminais, que não deformam significativamente a célula vegetativa. Estes esporos representam estruturas de resistência altamente especializadas, capazes de sobreviver a condições extremas de temperatura, dessecação, radiação e agentes químicos.

B. velezensis é uma bactéria quimiorganotrófica e aeróbia facultativa, capaz de crescer tanto na presença quanto na ausência de oxigênio. Em condições aeróbias, utiliza a respiração celular como principal via de obtenção de energia, enquanto em anaerobiose pode realizar processos fermentativos. Esta flexibilidade metabólica contribui significativamente para sua adaptabilidade a diferentes ambientes.

A versatilidade nutricional de B. velezensis é notável, sendo capaz de utilizar uma ampla gama de substratos orgânicos como fontes de carbono e energia. Carboidratos simples e complexos, aminoácidos, ácidos orgânicos e alguns compostos aromáticos podem ser metabolizados, refletindo a diversidade de enzimas extracelulares produzidas pela bactéria.

Os parâmetros ótimos de crescimento incluem temperaturas entre 25-37°C, embora possa crescer em faixas de 15-50°C, e pH entre 6,0-8,0, com tolerância a condições ligeiramente ácidas ou alcalinas. O tempo de geração em condições ótimas varia de 30-60 minutos, permitindo rápido estabelecimento populacional em ambientes favoráveis.

Ciclo de vida e esporulação

O ciclo de vida de Bacillus velezensis compreende duas fases principais: crescimento vegetativo e esporulação. Durante condições favoráveis, as células se multiplicam rapidamente por fissão binária, mantendo populações ativas e metabolicamente ativas. O processo de esporulação é iniciado quando as condições ambientais se tornam desfavoráveis, incluindo limitação de nutrientes, estresse osmótico ou temperaturas extremas.

A esporulação em B. velezensis segue o padrão característico do gênero, envolvendo divisão assimétrica da célula, desenvolvimento do pré-esporo, maturação do esporo e eventual lise da célula-mãe para liberação do endósporo. Este processo altamente regulado é controlado por cascatas de regulação gênica complexas, incluindo os genes spo e fatores sigma específicos.

Uma das características biológicas mais importantes de B. velezensis é sua capacidade de produzir diversos metabólitos secundários com atividade biológica. Os lipopeptídeos representam a classe mais estudada, incluindo surfactina, iturina, fengicina e bacillomicina. Estes compostos possuem propriedades antimicrobianas, surfactantes e de formação de poros em membranas celulares.

A produção de enzimas extracelulares é outra característica distintiva, incluindo proteases, amilases, celulases, quitinases e β-1,3-glucanases. Estas enzimas contribuem para a degradação de materiais orgânicos complexos e podem atuar diretamente na lise de paredes celulares de microrganismos patogênicos.

Sideróforos produzidos por B. velezensis facilitam a quelação de ferro, melhorando sua disponibilidade para a bactéria e limitando o acesso de patógenos a este micronutriente essencial. Adicionalmente, a produção de fitohormônios como auxinas, citocininas e giberelinas contribui diretamente para a promoção do crescimento vegetal.

Sistemas de comunicação e regulação

Bacillus velezensis possui sistemas sofisticados de comunicação celular, incluindo quorum sensing baseado em oligopeptídeos. Estes sistemas permitem a coordenação de atividades a nível populacional, regulando a produção de metabólitos secundários em resposta à densidade celular e condições ambientais.

A regulação da produção de metabólitos secundários envolve redes regulatórias complexas, incluindo reguladores globais como PlcR, DegU e ComA. Estes sistemas integram sinais ambientais e populacionais para otimizar a produção de compostos bioativos em condições apropriadas.

Ecologia e distribuição

B. velezensis apresenta distribuição cosmopolita, tendo sido isolada de diversos ambientes em todos os continentes. Seus habitats naturais incluem solos de diferentes tipos (agrícolas, florestais, áridos), rizosfera e filosfera de plantas, sedimentos aquáticos, fontes termais e ambientes extremos como solos salinos e regiões polares.

A abundância particular em solos cultivados e sistemas agrícolas sugere adaptações evolutivas específicas aos distúrbios antropogênicos e à presença de plantas cultivadas. Esta distribuição ampla reflete a tolerância da espécie a variações significativas de temperatura, pH, salinidade e disponibilidade de nutrientes.

A rizosfera representa o nicho ecológico mais importante para B. velezensis, onde estabelece relações complexas com plantas hospedeiras, outros microrganismos e o ambiente físico-químico do solo. A bactéria demonstra quimiotaxia positiva para exsudatos radiculares ricos em carboidratos, aminoácidos e ácidos orgânicos, permitindo colonização eficiente das raízes.

As densidades populacionais na rizosfera tipicamente variam de 10³ a 10⁶ UFC por grama de solo, dependendo da espécie vegetal, estágio de desenvolvimento da planta e condições ambientais. Esta variabilidade reflete a especificidade de diferentes linhagens para hospedeiros específicos e sua capacidade de competir com a microbiota nativa.

Interações planta-microrganismo

Bacillus velezensis estabelece relações mutualísticas com plantas, caracterizadas por benefícios recíprocos. A bactéria obtém nutrientes dos exsudatos radiculares e um ambiente protegido, enquanto proporciona múltiplos benefícios à planta hospedeira através de mecanismos diretos e indiretos.

A promoção direta do crescimento vegetal ocorre através da produção de fitohormônios, enquanto os mecanismos indiretos incluem melhoria da nutrição vegetal via solubilização de fosfatos, mobilização de micronutrientes e, em algumas linhagens, fixação de nitrogênio atmosférico. A capacidade de alguns isolados de estabelecer-se como endófitas proporciona proteção adicional contra estresses bióticos e abióticos.

Dinâmica populacional e fatores limitantes

A dinâmica populacional de B. velezensis no solo é influenciada por múltiplos fatores bióticos e abióticos. Temperatura, umidade, pH, disponibilidade de nutrientes e presença de plantas hospedeiras são os principais determinantes da densidade populacional. Em sistemas agrícolas, as populações tendem a ser maiores durante a estação de crescimento das culturas, quando os exsudatos radiculares são mais abundantes.

A formação de esporos permite a sobrevivência durante períodos desfavoráveis, incluindo secas prolongadas, temperaturas extremas ou ausência de hospedeiros. Esta capacidade de dormência é fundamental para a persistência a longo prazo em ambientes sazonalmente variáveis.

Interações microbianas

Bacillus velezensis participa de redes complexas de interações microbianas no solo, estabelecendo relações tanto antagônicas quanto sinérgicas com diferentes grupos microbianos. Com fungos micorrízicos arbusculares, frequentemente estabelece relações sinérgicas onde ambos contribuem para a nutrição e proteção das plantas.

As interações com outros rizobactérios promotores de crescimento vegetal podem resultar em consórcios microbianos benéficos ou competição por nichos similares. A coexistência é frequentemente mediada pela partição de recursos ou especialização temporal, refletindo estratégias evolutivas de coexistência.

Papel na ciclagem de nutrientes

B. velezensis contribui significativamente para os ciclos biogeoquímicos no solo através da produção de enzimas extracelulares que participam da decomposição de matéria orgânica. No ciclo do nitrogênio, algumas linhagens possuem capacidade de fixação de N₂ atmosférico e participam da mineralização de compostos nitrogenados orgânicos.

No ciclo do fósforo, a solubilização de fosfatos inorgânicos e a mineralização de fósforo orgânico representam contribuições ecológicas importantes, especialmente em solos com baixa disponibilidade deste nutriente. Estas atividades posicionam B. velezensis como um componente funcional importante da comunidade microbiana do solo.

Biocontrole de fitopatógenos

Bacillus velezensis demonstra eficácia excepcional como agente de biocontrole contra uma ampla gama de fitopatógenos, especialmente fungos de solo. Os mecanismos de biocontrole incluem antibiose através da produção de lipopeptídeos e outros compostos antimicrobianos, competição por nutrientes e espaço, e parasitismo direto via enzimas líticas.

A atividade antagônica é particularmente eficaz contra patógenos importantes como Fusarium oxysporum, Rhizoctonia solani, Pythium ultimum, Botrytis cinerea e Verticillium dahliae. Estudos demonstram reduções significativas na incidência de doenças quando B. velezensis é aplicada preventivamente através de tratamento de sementes, aplicação no solo ou pulverização foliar.

Promoção do crescimento vegetal

As propriedades de promoção do crescimento vegetal de B. velezensis são bem documentadas em diversas culturas, incluindo cereais, hortaliças, frutíferas e plantas ornamentais. Os incrementos típicos incluem aumento da germinação de sementes, desenvolvimento do sistema radicular, crescimento vegetativo e produtividade final.

Estudos em condições controladas e de campo demonstram incrementos de produtividade de 10-30% em diversas culturas quando B. velezensis é aplicada adequadamente. Estes benefícios são atribuídos à combinação de produção de fitohormônios, melhoria da nutrição mineral e proteção contra estresses bióticos e abióticos.

Desenvolvimento de produtos comerciais

O potencial comercial de Bacillus velezensis tem levado ao desenvolvimento de diversos produtos biológicos registrados em diferentes países. Formulações incluem pós molháveis, suspensões concentradas, grânulos e produtos líquidos, cada um otimizado para aplicações específicas e condições de armazenamento.

Linhagens comerciais importantes incluem QST713 (Serenade), FZB42 (RhizoVital), e diversas outras desenvolvidas por empresas de biotecnologia. O desenvolvimento de formulações estáveis e eficazes continua sendo uma área ativa de pesquisa e inovação tecnológica.

Integração com sistemas de manejo

B. velezensis pode ser integrada efetivamente em programas de manejo integrado de doenças e nutrição vegetal. A compatibilidade com outros produtos biológicos permite o desenvolvimento de consórcios microbianos com eficácia superior aos produtos individuais.

A integração com práticas agronômicas convencionais, incluindo uso criterioso de agroquímicos, pode resultar em sistemas de produção mais sustentáveis e eficientes. Estudos demonstram que aplicações preventivas de B. velezensis podem reduzir significativamente a necessidade de fungicidas químicos.

Aplicações em agricultura orgânica

B. velezensis é particularmente valiosa para sistemas de produção orgânica, onde as opções de controle de doenças são limitadas. A certificação orgânica de produtos baseados nesta espécie facilita sua adoção por produtores orgânicos.

A eficácia em condições de agricultura orgânica tem sido demonstrada em diversas culturas, contribuindo para a viabilização econômica de sistemas de produção sustentáveis. A compatibilidade com outros insumos orgânicos amplia as possibilidades de integração em sistemas de manejo holísticos.

Mecanismos de ação e aspectos moleculares

Os mecanismos moleculares do biocontrole por Bacillus velezensis envolvem a produção coordenada de múltiplos compostos antimicrobianos. Os lipopeptídeos representam a classe mais importante, com diferentes famílias apresentando espectros de ação complementares. A surfactina possui propriedades surfactantes e pode permeabilizar membranas celulares, enquanto iturina e fengicina apresentam atividade antifúngica específica.

A regulação da produção destes compostos envolve sistemas regulatórios complexos, incluindo sistemas de quorum sensing e reguladores globais. A expressão coordenada de genes de biossíntese permite a produção otimizada de compostos antimicrobianos em resposta a sinais ambientais e populacionais.

B. velezensis produz um arsenal diversificado de enzimas extracelulares que contribuem diretamente para o biocontrole. Quitinases e β-1,3-glucanases podem degradar componentes estruturais de paredes celulares fúngicas, enquanto proteases podem interferir com proteínas essenciais dos patógenos.

A expressão destas enzimas é regulada em resposta à presença de substratos específicos e condições ambientais. A produção constitutiva de algumas enzimas proporciona atividade antifúngica preventiva, enquanto a indução específica permite respostas direcionadas à presença de patógenos.

A promoção do crescimento vegetal por Bacillus velezensis envolve múltiplos mecanismos moleculares. A produção de auxinas, principalmente ácido indol-3-acético (AIA), é mediada por enzimas como triptofano aminotransferase e indol-3-piruvato descarboxilase. A síntese de citocininas e giberelinas envolve vias biossintéticas específicas que podem ser reguladas por condições ambientais.

A solubilização de fosfatos inorgânicos é mediada pela produção de ácidos orgânicos como ácido glucônico e cítrico, que reduzem o pH local e aumentam a solubilidade de fosfatos de cálcio e ferro. A produção de sideróforos envolve sistemas de biossíntese complexos que incluem sintases não-ribossomais específicas.

B. velezensis possui adaptações moleculares específicas para a colonização e sobrevivência na rizosfera. Sistemas de quimiotaxia permitem a migração direcionada em resposta a gradientes de nutrientes dos exsudatos radiculares. A capacidade de formar biofilmes facilita a adesão às superfícies radiculares e proteção contra estresses ambientais.

A competência para transformação natural permite a aquisição de DNA exógeno, potencialmente contribuindo para adaptação a novos ambientes. Sistemas de restrição-modificação protegem contra DNA estranho, mantendo a integridade genômica.

Plasticidade genômica e evolução

O genoma de Bacillus velezensis apresenta considerável plasticidade, com variações no conteúdo gênico entre diferentes linhagens. Elementos móveis, ilhas genômicas e clusters de genes para metabólitos secundários contribuem para esta diversidade. A presença de múltiplas cópias de genes para metabólitos secundários em algumas linhagens pode conferir vantagens adaptativas específicas.

A análise comparativa de genomas revela que linhagens isoladas de diferentes ambientes apresentam adaptações específicas, incluindo diferenças na capacidade de utilização de substratos, resistência a estresses e produção de metabólitos secundários. Esta diversidade genética é fundamental para o sucesso ecológico da espécie.

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