Reflexões sobre a guerra e o agro
Desde a eclosão do conflito, o governo brasileiro tem optado por um discurso de neutralidade
Em uma década marcada pela proliferação de investimentos sustentáveis, a Cédula de Produto Rural (CPR) Verde surge como uma potencial fonte de financiamento do setor agropecuário brasileiro. Trata-se de um instrumento que visa angariar recursos financeiros para manter a operação agropecuária e, ao mesmo tempo, preservar a biodiversidade.
Recentemente, a Lei 8.929/94 (Lei da CPR) sofreu várias alterações por meio da Lei 13.986/20 (Lei do Agro). Entre elas, chama a atenção a inclusão do inciso II no §2º do art. 1.º, que permitiu a emissão de CPRs “relacionadas à conservação de florestas nativas e dos respectivos biomas e ao manejo de florestas nativas no âmbito do programa de concessão de florestas públicas, ou obtidos em outras atividades florestais que vierem a ser definidas pelo Poder Executivo como ambientalmente sustentáveis”, operação recentemente regulamentada pelo Decreto 10.828/21.
A CPR, em sua concepção original, permite ao produtor rural captar os recursos ou insumos necessários para operacionalizar sua safra em troca de parte de sua produção. Qual seria, então, a função da CPR Verde? Em um país como o Brasil, no qual, em algumas regiões, o produtor rural é obrigado a preservar de forma compulsória parte de sua área total como reserva legal, a CPR Verde surge como instrumento para remunerar essa preservação e incentivar a ampliação da área preservada em troca de capital.
Com a mudança, existe a possibilidade do produtor rural poderá ser remunerado por uma atividade que já realiza em estrito cumprimento da lei – manutenção e conservação de mata nativa – e receber incentivo para ampliar essa atividade, o que ajudará a mitigar o dano ambiental muitas vezes atribuído à produção rural. Além disso, a medida contribuirá para a melhora da imagem do agronegócio brasileiro no mercado interno e externo, muito atribuído ao desmatamento.
Sob a ótica de financiamento, não faltam interessados na aplicação e difusão do instrumento. Companhias que, por força da sua atividade, lançam gases nocivos no meio ambiente poderão usar um mecanismo capaz de garantir os créditos de carbono necessários para compensar os danos que provocam.
Esse cenário ganha mais força diante dos compromissos assumidos recentemente na COP 26, como o pacto para reduzir a emissão do gás metanol em até 30% até 2030 e a declaração para restauração e proteção das florestas do planeta – o que inclui a Amazônia brasileira –, com investimentos estimados em US$ 19,2 bilhões.
Ainda há questões a serem superadas para popularizar o título, como saber a quem será atribuída a responsabilidade pela certificação do instrumento, a forma como será realizado o acompanhamento dos compromissos firmados, o papel das instituições governamentais em sua validação e como será regulado o mercado de crédito de carbono brasileiro, entre outras questões.
Apesar de todas essas indefinições, não há impedimento para quem já quiser aproveitar as mudanças implementadas. A conservação ambiental, por meio do uso de técnicas de monitoramento de safra/produto conhecidas do mercado, poderá ser uma condicionante ou até a garantia para a emissão de uma CPR tradicional.
Vale lembrar que, em 2021, foi instituída a Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais (Lei 14.119/21) que reforça a abordagem mais sustentável da questão ambiental. Aqueles que veem as alterações implementadas na Nova Lei do Agro como oportunidade de novos negócios já estão na dianteira para aproveitar os benefícios proporcionados por essas inovações legais.
por João Reis e Luis Fernando Ticianeli Ferreira; sócio e advogado da área de Contencioso do Machado Meyer Advogados
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